quinta-feira, 8 de junho de 2017

"Os anos loucos" - Serge Halimi

Aos olhos deles, a tempestade passou, a eleição de Donald Trump e o Brexit quase estão esconjurados. A ampla vitória de Emmanuel Macron entusiasmou os meios dirigentes da União Europeia. Um dos seus comentadores ajuramentados, ronronando de felicidade, considerou mesmo que se tratava do «primeiro golpe decisivo contra a vaga populista». Aproveitar o momento para fazer passar em força o programa neoliberal da Comissão Europeia entusiasma, portanto, os novos governantes franceses, que têm em mira o Código do Trabalho. Uma orientação política idêntica será agora representada em Paris por um homem mais jovem, mais culto e menos radicalmente desprovido de imaginação e de carisma do que o seu antecessor. Os milagres da comunicação e do «voto útil» permitem travestir esta ligeira mudança e apresentá-la como uma viragem histórica que abre caminho a toda a audácia. O apagamento da clivagem entre os dois campos, de que se faz chantre uma comunicação social ocidental à beira de desfalecer perante o seu mais recente prodígio, é também uma fantasia. Com efeito, desde 1983 que a esquerda e a direita francesas aplicam, à vez, a mesma política. Doravante, sectores de uma e de outra vão encontrar-se num mesmo governo. No futuro encontrar-se-ão numa mesma maioria parlamentar. Ganha-se em clareza, mas não mais do que isso.

A incrustação no poder de uma direita espanhola corrupta, a vitória dos liberais nos Países Baixos, e o novo contrato governamental prometido, talvez de forma imprudente, aos conservadores britânicos e alemães sugerem que o tempo das cóleras que marcou o ano passado pode ter perdido fôlego, por falta de saídas políticas. A eleição de Macron, tendo como pano de fundo a bandeira azul e dourada e a sua visita imediata a Berlim, assinalam em todo o caso que as grandes orientações europeias defendidas pela chanceler Angela Merkel serão vigorosamente reconduzidas. Para os gregos, essas orientações acabam de conduzir a um corte de 9% das suas pensões de reforma; os peritos já só discordam no momento de determinar se se trata do décimo terceiro ou do décimo quarto corte do género. Quanto a Donald Trump, que tem tido alguns arrebatamentos e fanfarronices capazes de preocupar por alguns momentos as diplomacias ocidentais, diga-se que a normalização da sua presidência está bastante avançada; em caso de necessidade, o seu impedimento (impeachement) está também organizado. Para garantir a completa serenidade dos timoneiros do velho mundo já só falta um regresso ao poder de Matteo Renzi, em Itália, nos próximos meses.

Durante a década de 1920, constatando que depois de uma era de greves e de revoluções a maior parte dos Estados europeus – em particular o Reino Unido e a Alemanha – haviam recuperado a sua velocidade de cruzeiro, a Internacional Comunista teve de admitir a «estabilização do capitalismo». Ainda assim, empenhada em não desarmar, em Setembro de 1928 a organização anunciou que a acalmia seria «parcial, temporária e precária». O anúncio pareceu mecânico, senão mesmo um palavreado inútil. Vivia-se a euforia dos possidentes, os Anos Loucos. A «quinta-feira negra» de Wall Street rebentou passado um ano.

quarta-feira 7 de Junho de 2017

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