quarta-feira, 30 de março de 2016

Palestine’s Land Day



On this day in 1976, thousands of Palestinians marched in towns and villages across the Galilee region, in the north of present-day Israel, to protest Israel’s expropriation of vast tracts of land as part of its openly declared policy to “Judaize” the area at the expense of the indigenous population.

No Zionism without “evacuation” and “confiscation”

“Following the Zionist tenets, Israel has systematically and callously followed an intricate and continuous process of Arab land expropriation through the promulgation of new laws, the circumvention of existing laws, harassment and duplicity. Recognizing the naked truth, Y. Ben-Porat, a known ‘hawk’ wrote ‘One truth is that there is no Zionism, no settlement, no Jewish state without evacuation of the Arabs and confiscation and enclosure of their land,’” anthropologist Khalil Nakhleh wrote in The Journal of Palestine Studies in 1976.

Frustration and anger at Israel’s land theft from, and discrmination against, Palestinian citizens of Israel had been mounting for years.

Nakhleh adds: “To protest against the essence of this process and orders for new expropriations, the Arab population declared a general strike for 30 March 1976. In an effort to preempt the strike, army and border police, including armored units, were dispatched to the most affected Arab villages. Violent confrontations ensued, and left behind six Arabs killed, tens wounded and hundreds arrested. March 30 was commemorated asYawm al-Ard or the Day of the Land.”

Israeli violence

“On that day, quiet demonstrations in the villages of Sakhnin, Arabeh and Dir Hanna were confronted by an aggressive police and army presence which later turned on them in violent confrontations,” historian Ilan Pappewrites in his book The Forgotten Palestinians.

Already, on 28 March, “the Minister of Police declared that his forces were ‘ready to break into the Arab villages’ – he used the Hebrew word ‘lifroz,’ which is usually employed to describe assaults on enemy lines and bases,” Pappe explains.

Pappe gives the names of those killed as Khayr Muhammad Yasin from Arabeh, Raja Hussein Abu Riya, Khader Abd Khalil and Khadija Juhayna from Sakhnin, Muhammad Yusuf Taha from Kafr Kana and Rafat Zuhairi from Nur Shams refugee camp, who was shot in Taybeh.

Turning point

The Day of the Land – or Land Day – marked a turning point as the first mass mobilization by Palestinians within Israel against internal colonialism and land theft.

Its commemoration is a reaffirmation that the Palestinians who remained in the areas on which Israel was declared in 1948 are an inseparable part of the Palestinian people and their struggle.

Land Day continues to resonate with Palestinians everywhere because it does not just mark a past historical event, but draws attention to Israel’s ongoing violent, settler-colonial process of “Judaization.”

Israel continues to steal land from Palestinians and to displace them in every part of historic Palestine from thenorth, to the occupied West Bank, to the Naqab (Negev) in the south.

"The Strange Case of a Nazi Who Became an Israeli Hitman"



Otto Skorzeny, one of the Mossad’s most valuable assets, was a former lieutenant colonel in Nazi Germany’s Waffen-SS and one of Adolf Hitler’s favorites.

Assim vai a Europa! - Dívida e direitos humanos: o caso grego


O perito independente das Nações Unidas Juan Pablo Bohoslavsky publicou recentemente o seu relatório sobre a situação da Grécia e faz o retrato de um país afogado pela dívida e pela austeridade.

Artigo de Eric Toussaint, porta-voz do CADTM Internacional e coordenador técnico da Comissão para a Auditoria e Verdade sobre a Dívida Grega.

segunda-feira, 28 de março de 2016

Filme recomendado - "O Filho de Saúl"



Realização de László Nemes

"CIA photographed detainees naked before sending them to be tortured"


Classified pictures showing CIA captives bruised, blindfolded and bound raise new questions about US’s willingness to use ‘sexual humiliation’ on suspects.

Lettre de Victor Hugo à Lamartine - "Voilà pourquoi j'ai fait Les Misérables"




Mon illustre ami,

Si le radical, c’est l’idéal, oui, je suis radical. Oui, à tous les points de vue, je comprends, je veux et j’appelle le mieux ; le mieux, quoique dénoncé par le proverbe, n’est pas ennemi du bien, car cela reviendrait à dire : le mieux est l’ami du mal. Oui, une société qui admet la misère, oui, une religion qui admet l’enfer, oui, une humanité qui admet la guerre, me semblent une société, une religion et une humanité inférieures, et c’est vers la société d’en haut, vers l’humanité d’en haut et vers la religion d’en haut que je tends : société sans roi, humanité sans frontières, religion sans livre. Oui, je combats le prêtre qui vend le mensonge et le juge qui rend l’injustice. Universaliser la propriété (ce qui est le contraire de l’abolir) en supprimant le parasitisme, c’est-à-dire arriver à ce but : tout homme propriétaire et aucun homme maître, voilà pour moi la véritable économie sociale et politique. Le but est éloigné. Est-ce une raison pour n’y pas marcher ? J’abrège et je me résume. Oui, autant qu’il est permis à l’homme de vouloir, je veux détruire la fatalité humaine ; je condamne l’esclavage, je chasse la misère, j’enseigne l’ignorance, je traite la maladie, j’éclaire la nuit, je hais la haine.
Voilà ce que je suis, et voilà pourquoi j’ai fait Les Misérables.
Dans ma pensée, Les Misérables ne sont autre chose qu’un livre ayant la fraternité pour base et le progrès pour cime.
Maintenant jugez-moi. […]

"Scale of Hearst plot to discredit Orson Welles and Citizen Kane revealed"


Memos show media mogul William Randolph Hearst’s executives conspired to undermine Welles and stop release of film.

domingo, 27 de março de 2016

Irlanda - "Revolta da Páscoa" - "Easter Rising"


"Da burka ao colete de explosivos" - José Pacheco Pereira

Acabar com o Daesh é possível por meios militares, mas nos últimos vinte anos emergiu uma realidade política e religiosa de natureza muito violenta que existe muito para além do terreno sírio e iraquiano, e está nas nossas cidades.

Recentemente estive num país europeu onde um dos aspectos em que as ruas mais visivelmente mudaram foi o número cada vez maior de mulheres comniqab e algumas com burka. Um niqab, que mostra apenas os olhos da mulher, ou a burka que nem isso mostra, não é nada que passe desapercebido, deixando a milhas o vulgar lenço na cabeça muitas vezes usado com uma roupa em nada diferente da que traria uma rapariga não muçulmana qualquer, ou um mais envolvente hijab, ou um chador, que pela sua preocupação de tapar todo o corpo da mulher, com excepção da face, já proclama mais claramente a prisão a que, em todos estes casos, o corpo da mulher está sujeito. Hijab, chador, niqab e burka reflectem uma hierarquia com distintas origens e tradições, mas em todos os casos significam uma menorização do corpo da mulher e são um símbolo do poder masculino.

Num elevador com duas ou três mulheres, velhas e novas, de niqab, ou num restaurante perguntando-me como é que comem quando todas as atenções estão viradas para elas, como é inevitável, a sua presença gera uma grande sensação de desconforto. Preferia não ter de partilhar um espaço pequeno, mesmo que por minutos, com mulheres que se vestem assim. Incomoda e muito.

Pergunto-me se este tipo de desconforto seria o mesmo que teria um branco no Mississippi se tivesse de se sentar num autocarro ao lado de uma negra nos tempos da segregação. Ou será que o mesmo tipo de desconforto terá um devoto muçulmano se numa aldeia nigeriana, ou numa vila do interior da Anatólia, ou no Magrebe, se tivesse ao seu lado uma mulher "pouco vestida" segundo os seus cânones de correcta maneira de vestir? Aliás, para este último exemplo, não preciso sequer de ir para o mundo do islão: já vi a comoção gerada por uma rapariga que amamentava o filho num café e para isso mostrava um seio. Ou, se se quiser, o incómodo causado por um transexual num meio pequeno e fora dos sítios trendy das cidades. Em quase todos estes casos, mesmo no caso do transexual, é o corpo feminino, a sua ocultação ou exibição, ou a sua assunção pelo sexo "errado", que está em causa. Não sei que mal fizeram as mulheres, com excepção dessa serva da serpente, Eva, para gerarem este tipo de reacção. Saber sei, há muitos estudos de antropologia e psicologia que o explicam, mas sabendo, não sei.

Ora, um dos aspectos mais complexos de uma alteridade cultural, que representa uma fronteira "civilizacional", é o modo como no mundo do islão todas as tentativas de modernização têm encalhado na dificuldade de conceber um papel diferente para a mulher, que não a considere propriedade dos homens, do marido aos irmãos e aos pais, e que não a marque com um vestuário humilhante que se destina a mostrar a sua subjugação. É por isso que o niqab é ofensivo, tanto mais quando ao lado da mulher assim escondida está um marido jovem, desempoeirado, de jeans e telemóvel em punho, que, como é óbvio, não segue qualquer código de vestuário e a transporta como se fosse uma peanha.

No debate sobre o terrorismo que se está a travar, antes com a Al-Qaeda, agora com o Daesh, o facto de alguns dos terroristas que combatem na Síria ou no Iraque serem europeus, e os actos de terrorismo apocalíptico em que o objectivo é matar o maior número de "infiéis" no menor tempo possível serem de responsabilidade de jovens muçulmanos nascidos na França ou na Bélgica, obriga a olhar para Marselha, Paris, Bruxelas e Londres e saber o que é que aí está a acontecer. Obriga-nos também a perceber com ainda maior clareza que o relativismo "multicultural" pode ser muito bem avontadado, mas representa uma cedência de valores civilizacionais inaceitável por quem acredita que um mundo com direitos humanos é melhor do que a aceitação de qualquer selvajaria em nome dos "costumes" ou da religião.

Ora, se o terrorismo em si não pode ter qualquer explicação que menorize o acto criminoso por qualquer determinação causal como o desemprego, a exclusão, ou qualquer outro factor socioeconómico, já importa saber por que razão é que nas comunidades onde se "criaram" estes terroristas eles são o seu produto, assim como nelas se movem à vontade, mesmo depois de se saber o que fizeram, como na velha metáfora guerrilheira, como "peixe na água". Então há todo um conjunto de factores que se tornam explicativos, explicativos não são justificativos, e entre eles avultam todos os que tornaram estas comunidades muçulmanas europeias, em particular em França, Bélgica e Reino Unido, esse espaço em que os terroristas se movem como "peixe na água". Porque apesar das sucessivas declarações apaziguadoras de que a maioria das pessoas que vivem em bairros como Molenbeek em Bruxelas são gente pacífica — e são — e que condena com toda a veemência os actos de terrorismo — aí já não é bem assim, há nuances —, a verdade é que essas comunidades, que deveriam estar na vanguarda da luta contra o terrorismo que lhe é tão próximo, estão longe de o estar. E aí contam as fronteiras que a alteridade cultural ajudou a erguer, dobrada da crescente adesão dos jovens a um islão fundamentalista, e que reforçam o gueto por dentro. Por fora, sabemos quais são os factores que reforçam esse mesmo gueto, a falta de mobilidade vertical que a estagnação económica da Europa dos últimos anos acentuou e a dificuldade que as sociedades europeias têm de criar o élanascendente que o melting pot americano tem conseguido para a maioria dos seus emigrantes, muitos dos quais chegam sem nada. Na confluência das duas atitudes de gueto resulta que nos microcosmos, como os bairros pobres de Marselha, Londres, Paris e Bruxelas, se há islão moderado, não se ouve, nem parece existir, e o que acontece é uma crescente raiva, manifesta em particular nos jovens contra uma sociedade, que os leva a acentuar ainda mais o isolamento cultural e social. E as raparigas que usam ostensivamente pelo menos uma qualquer forma de "vestuário" islâmico recusam-se a cumprimentar os homens e a ser vistas nos hospitais por médicos e não podem esperar ter muitos dos empregos a que poderiam aceder.

Mas atenção, também aqui os homens se comportam de forma diferente. Quando se diz que os atentados de Paris são contra o "nosso modo de vida", cafés, restaurantes, uma sala de diversão, só em parte é verdade, porque muitos desses jovens radicalizados por uma corrente do islão fundamentalista vivem muito bem nesse "modo de vida": bebem, frequentam prostitutas, vestem-se à ocidental. Até um dia.

Depois há aquele factor que também o nosso "politicamente correcto" tem dificuldade em confrontar: o terrorismo da Al-Qaeda e do Daesh comporta uma componente religiosa, ou melhor, político-religiosa, que temos muita dificuldade em perceber em sociedades já com séculos de laicização. A resposta que se dá vai das alarvidades de Trump às proclamações sucessivas de que o islão "nada tem que ver" com o terrorismo, que é uma perversão do islão. Na verdade, tem. Não podemos separar o lado "bom" do "mau" de uma religião. Há uma corrente no islão, aliás já antiga, que justifica a exterminação dos "infiéis", como no passado aconteceu também no cristianismo. Aliás, deveríamos voltar à nossa história cristã para perceber alguma coisa sobre este fundamentalismo, visto que já o tivemos com bastante força no cristianismo, e está longe de desaparecer de todo. Por isso, se ignoramos que estes jovens que se suicidam, e também matam, têm também motivações do foro religioso, não percebemos que a religião, entendida de uma forma que nós consideramos para nosso conforto como "pervertida", está presente nos actos dos terroristas.

Acabar com o Daesh é possível por meios militares, mas nos últimos vinte anos emergiu uma realidade política e religiosa de natureza muito violenta que existe muito para além do terreno sírio e iraquiano, e está nas nossas cidades. A experiência militar e operacional que estes jovens ganharam na Síria combatendo com o Daesh é importante, mas não é preciso ter uma grande experiência militar, saber muito de explosivos, e obter Kalashnikovs, o que não é difícil, para criar o caos criminoso num campo de futebol ou numa rua apinhada ao fim da tarde. Contrariamente ao que às vezes se sugere, não há grande sofisticação nestes atentados, com regras de clandestinidade rudimentares que só funcionam porque é difícil infiltrar estes meios, ou porque os serviços de informação como os belgas não viram nada na rua ao lado. Melhor humint melhora muito o combate ao terrorismo, mas mesmo assim não o impede de todo.

Dito isto, estamos metidos num grande sarilho.

No Dia Mundial do Teatro nasceu uma nova companhia! Aleluia!



Teatro. Nasceu uma nova companhia, sem regras nem amarras

Dossier Brasil: "Brasil: Uma História Inconveniente"


Livro recomendado - "Bestiário"


"Guerra contra la memoria en Argentina"


Coincidiendo con la llegada de Obama a Buenos Aires, una operación de des-ideologización y desmemoria está en marcha en Argentina.

"O que Portugal tem a ver com o Brasil" - Alexandra Lucas Coelho


1. Os portugueses não parecem ter uma boa relação com os brasileiros, disse-me uma alemã, conhecedora profissional de Portugal e Brasil. Estávamos na Alemanha, o Brasil temia uma guerra civil, foi há dez dias. A minha interlocutora não se referia à relação de portugueses com brasileiros nesta crise, e sim em geral. A minha resposta instintiva foi contrapor, contar por exemplo como muitos portugueses cresceram com música brasileira, e isso é parte da nossa vida. Agora, de volta a casa, continuo a pensar na observação desta veterana, que nada tinha de provocadora, era só vontade de entender. Muitos portugueses, creio, teriam respondido da mesma forma instintiva, a que podemos chamar amorosa. Mas é impossível ignorar o que se tem manifestado em Portugal de equívoco face ao Brasil ao longo destes dias. Não sendo novidade, acho que nunca o tinha visto propagado assim, talvez porque nunca houve tantos meios para isso, e porque este tempo apocalíptico favorece uma excitação de circo romano. Em 2016, facilmente o clamor se torna viral, entre media e redes sociais. Justiceiros instântaneos brotam de um clique, prolongando 516 anos de equívocos. Segundo um desses equívocos, provável pai dos outros, o tema da colonização encerrou-se, chega de falar dele, é passado. Penso o contrário, que mal começámos, que é presente, e a actual crise brasileira acentua isso. Não só pelo que expõe das estruturas brasileiras, como pelo que revelou do olhar de Portugal sobre o Brasil, e sobre si mesmo.

2. Com esse nome, o Brasil viveu 322 anos de ocupação portuguesa e 194 de independência. Se alguém acredita que o tempo da independência poderia já ter curado o tempo da ocupação, precisa de voltar à história luso-brasileira, porque o alcance da violência vai longe, e em muitas direcções. Esses 322 anos actuam diariamente naquilo que é hoje o Brasil, na clivagem entre São Paulo e o Nordeste, nos milhões que ainda moram em favelas, na relação Casa-Grande & Senzala das elites com os empregados, na violência da polícia que continua a ser militar, do desmando oligárquico dos que controlam aparelhos e estados, no saque catastrófico da natureza, na traição aos grupos indígenas, na evangelização dos pobres, radicalizando o conservadorismo num país onde se morre de aborto. Não é elenco para uma crónica, tem sido e será para muitas, livros, bibliotecas. O lulismo fez coisas importantes contra parte dessa herança (nas desigualdades mais urgentes, na cultura), não fez o suficiente contra boa parte disto (na educação, na saúde, na polícia), fez coisas que pioraram isto (um capitalismo com consequências devastadoras no ambiente e nas questões indígenas), e historicamente produziu uma geração que o critica e supera pela esquerda, num caldo inédito de periferias politicamente empoderadas e uma nova faixa politizada vinda da elite. Então, qualquer discurso maniqueísta de besta ou bestial não dará conta de Luiz Inácio Lula da Silva, figura complexa, decisiva, que ainda desafiará a história quando já não restar memória de quem agora, com reconhecível sobranceria colonial, o tenta reduzir. O prazer de ver alguém cair sempre fez dos homens uma alcateia. E a recente lista de subornos da Odebrecht é um exemplo de como a corrupção se mantém transversal na política.

3. A violência sistémica brasileira tem raízes nas duas violências fundadoras da colonização portuguesa, extermínio indígena e escravatura africana. Os portugueses não inventaram a escravatura, mas inauguraram o tráfico em grande escala. Dos 12 milhões de indivíduos que as potências europeias deportaram de África até ao século XVIII, 5,8 milhões foram traficados por Portugal. Isto significa 47 por cento, ou seja quase metade do tráfico foi assegurado por Portugal, e a grande maioria destinava-se a sustentar a colonização do Brasil (os números podem variar consoante os estudos, estes são do recente Racismos, de Francisco Bethencourt). A escravatura é um horror antiquíssimo, sim, e entre os séculos XV e XVIII a forma portuguesa de a praticar foi secundada por ingleses, espanhóis, franceses, holandeses, sim. Mas a Portugal coube esta iniciativa: deportação em massa, para nela assentar a exploração brutal de um território gigante, à custa do qual um território minúsculo viveu, como toda uma bibliografia tem mostrado de forma cada vez mais desassombrada. Não aprendi isto na escola, e tenho sérias dúvidas de que a maior parte dos portugueses faça ideia de que Portugal, sozinho, deportou tantos africanos como os judeus mortos no Holocausto, com a ajuda teológica e logística da Igreja Católica, depois de ter levado ao extermínio de ninguém sabe quantos índios, provavelmente não menos de um milhão. Enquanto isto (e tudo o que nisto diz respeito a África, claro, e o tanto que falta do Oriente, etc, etc) não entrar a sério nos programas escolares, o império colonial português será futuro por enfrentar, e não passado: é um problema nosso. Ao Brasil, mais do que nunca, cabe superar o que o Brasil-colónia deixou no Brasil-independente, depois república, ditadura, democracia. A Portugal cabe integrar as várias partes desta história que foram deixadas para trás, por razões pesudo-patrióticas que só bloqueiam os portugueses. Feito, aventura, audácia seria descobrir o encoberto, que não é o de Álcacer-Quibir, mas o que nos recusamos a saber. Não se trata de auto-flagelação, desculpabilização do Brasil independente, ódio a Portugal ou substituição de uma versão por outra, mas, como já escrevi a propósito da posse de Marcelo, de ter coragem para integrar na história outros factos, torná-la mais prismática e liberta de serviços. Não é possível usar um pedaço de história na lapela, remetendo os outros para um tempo anacrónico, com o argumento: nesse tempo era assim. Foi assim porque os portugueses também fizeram muito por isso. E nem sempre era assim, e para muitos não foi assim, a história está cheia de exemplos de quem se opôs, sempre houve embates, o espanhol Bartolomé de las Casas não partilhava a visão concentracionária dos jesuítas portugueses em relação aos ameríndios, tal como várias vozes se foram levantando contra a escravatura africana: mas o Brasil escravocrata, herdeiro dos privilégios, foi o último país americano a aboli-la, em 1888. Dito de outro modo, a história é presente, faz-nos e é feita por nós, agora. Mas, claro, podemos continuar bloqueados no pensamento único de como fomos grandes, e os brasileiros não têm emenda, no mínimo uns bons selvagens, como na célebre metáfora das esculturas em murta do padre António Vieira, esse sem dúvida brilhante orador do império, e idealizador do quinto império, que não viu obstáculos morais a substituir a escravatura indígena pela africana. Ao contrário das firmes esculturas em pedra, as de murta fingem comportar-se, mas voltam à rebaldaria selvagem, mal o jardineiro, leia-se, colonizador, se ausenta. Muito do que li nestes dez dias, entre media e comentários em Portugal, podia resumir-se a isto. Brasil: uma rebaldaria.

4. Sim, só que não. O mais perto de um milagre para mim, invocando Noel Rosa, é como o brasileiro todos os dias passa de português. Sendo a violência diária que é, sendo a tristeza trágica que é, o Brasil consegue ser uma laranja no Inverno. Imaginar um mundo sem Brasil lembra-me aquela não-ficção de Oliver Sacks em que um homem começa a ver tudo cinzento, até as laranjas. O mundo sem Brasil: impensável, como uma laranja cinzenta. Ou pensável, sim: meio caminho para amar ainda mais o Brasil, além das muitas razões que o Brasil todos os dias nos dá, de João Guimarães Rosa a qualquer roda dançando sobre cacos e cinzas.

5. E com imbatível auto-crítica. Se a auto-estima de um carioca não tem par, até porque o Rio não tem par, a disponibilidade para a auto-crítica também não. Despedi-me do Rio com uma crónica no “Globo” falando do Brasil racista, capitalista, violento. Não quero imaginar os comentários no “Público” se um carioca fizesse o mesmo em relação a Portugal. Lendo os comentários do “Público” por estes dias, um amigo brasileiro, daqueles que vieram da periferia mais pobre, comentou, impressionado: que violência, esses leitores. E que fizeram os cariocas comigo? Multiplicaram as críticas que eu fazia milhares de vezes, não tenho outra forma de dizer isto para sublinhar a espantosa capacidade carioca. Onde a gente diz mata, eles vão dizer esfola, bem mais do que xingar o ex-colonizador. Há preconceito no Brasil contra português? Há, sobretudo entre as elites mais ignorantes. Há anedotas de padeiros, da terrinha, dos lusos literais? Desinteresse, ignorância? Sim. Mas que é isso comparado com a violência portuguesa que desponta quando se sente um pouco mais autorizada? Tudo pesado, é raro brasileiros serem violentos em relação a portugueses. O contrário não é verdadeiro. Pasmo vendo como essa violência vem ao de cima, ignorando a história portuguesa e a odisseia extraordinária, quotidiana, de milhões de brasileiros. Recorri muito a uma ideia de Jaime Cortesão nas últimas semanas, mas nunca a citei nestas crónicas, e acho que valia a pena ir ao fundo do que ela diz: uma das melhores formas de ser português é amar o Brasil.

quinta-feira, 24 de março de 2016

"Some thoughts on the psycho-geography of Europe’s free movement" - Eva Hoffman


Eastern European migration takes place in a very different context than it once did. What drives people to leave, and what drives them back again?

Até Sempre! - Johan Cruyff (1947/2016)





Iran Prison Atlas


United for Iran launched the Iran Prison Atlas in 2012 as a real-time tool for documenting the background, treatment, and procedural violations of the cases of Iran’s political prisoners. Since its inception, Iran Prison Atlas has been overseen and updated by former political prisoners, utilizing their experience and contacts. The Atlas now provides a more complete view of Iran’a prison system. The Altas now contains over 2,000 records on Iranian judges, prisons, and political prisoners and is used by United Nations officials, national governments, and advocacy groups worldwide.



Veja aqui o Atlas.

"Noam Chomsky Joins DiEM25"


“The formation of the European Union,” explained Chomsky, “was a highly encouraging step forward in world affairs, with great promise.” However, in view of the American scholar, the EU “now faces severe threats, from within, tracing in no small measure to the attack on democracy.”

segunda-feira, 21 de março de 2016

No Dia Mundial da Poesia: um poema "Sobre um Poema"



Sobre um Poema

Um poema cresce inseguramente
na confusão da carne,
sobe ainda sem palavras, só ferocidade e gosto,
talvez como sangue
ou sombra de sangue pelos canais do ser.

Fora existe o mundo. Fora, a esplêndida violência
ou os bagos de uva de onde nascem
as raízes minúsculas do sol.
Fora, os corpos genuínos e inalteráveis
do nosso amor,
os rios, a grande paz exterior das coisas,
as folhas dormindo o silêncio,
as sementes à beira do vento,
- a hora teatral da posse.
E o poema cresce tomando tudo em seu regaço.

E já nenhum poder destrói o poema.
Insustentável, único,
invade as órbitas, a face amorfa das paredes,
a miséria dos minutos,
a força sustida das coisas,
a redonda e livre harmonia do mundo.

- Em baixo o instrumento perplexo ignora
a espinha do mistério.
- E o poema faz-se contra o tempo e a carne.

Herberto Helder

Parabéns ao "Twitter"!

O meu Twitter

Dia Internacional da Floresta


This global celebration of forests provides a platform to raise awareness of the importance of all types of forests and of trees outside forests.Forests cover one third of the Earth's land mass, performing vital functions around the world. Around 1.6 billion people - including more than 2,000 indigenous cultures - depend on forests for their livelihood.Forests are the most biologically-diverse ecosystems on land, home to more than 80% of the terrestrial species of animals, plants and insects. They also provide shelter, jobs and security for forest-dependent communities.Yet despite all of these priceless ecological, economic, social and health benefits, global deforestation continues at an alarming rate - 13 million hectares of forest are destroyed annually. Deforestation accounts for 12 to 20 percent of the global greenhouse gas emissions that contribute to climate change.

International Day for the Elimination of Racial Discrimination



Today we are witnessing a surge of intolerance, racist views and hate-driven violence. In these tumultuous times, we must stand up for rights and dignity for all, and for diversity and pluralism. We must speak out against anti-Semitism, anti-Muslim bigotry and other forms of hate. An assault on one minority community is an attack on all.

terça-feira, 15 de março de 2016

"Poverty is Sexist"


Last year ONE released its first “Poverty is Sexist” report, aimed at pressuring leaders to put girls and women at the heart of key policies and decisions. The report demonstrated two truths:

1. That poverty and gender inequality go hand-in-hand. Being born in a poor country and being born female amount to a double whammy for girls and women: they are significantly worse off than their counterparts in richer countries, and in every sphere they are hit harder by poverty than men.

2. Investments targeted towards girls and women pay dividends in lifting everyone out of poverty more quickly, and are essential in the overall fight to end extreme poverty everywhere.

"From hope to horror: Five years of crisis in Syria"


A horrifying catalogue of human rights abuses including war crimes and crimes against humanity have overwhelmed Syria over the past five years causing human suffering on a vast scale, said Amnesty International, marking the five-year anniversary of the start of anti-government protests in the country on 15 March 2011.

segunda-feira, 14 de março de 2016

"Que «plano B»?" - Sandra Monteiro



O processo de discussão e aprovação do Orçamento do Estado para 2016 fornece já matéria de sobra para se reflectir sobre as práticas e os discursos políticos que enquadram as respostas dadas à crise pelo dois campos que esta criou: o austeritário e o anti-austeritário, cada um dos quais com escala nacional e europeia. O Partido Socialista (PS), que governa no âmbito dos acordos com as forças políticas à sua esquerda, sabe que apresentou à votação um Orçamento mais restritivo do que aquele que o governo inicialmente submeteu à «avaliação» das instâncias da União Europeia. Isto significa que o garrote europeu às políticas alternativas já começou, mesmo que se considere que ocorreram a um nível aceitável.

A focagem no acordo alcançado com a União alimenta para já a ideia, verdadeira aposta dos socialistas, de que existe margem de manobra nas instâncias europeias para aceitar orientações e políticas contrárias à ortodoxia neoliberal dominante. Mas a marca indelével das imposições europeias já lá está: como todos, à esquerda, admitem, o Orçamento veio de Bruxelas pior.

Mesmo assim, o documento agora aprovado no Parlamento rompe, em aspectos significativos, com a governação dos anos anteriores, permitindo afirmar que 2016 será um ano de importante redução da austeridade sobre as classes baixas e médias, aumentando pensões e salários, sobretudo na função pública (onde mais haviam sido reduzidos), e reforçando também as prestações sociais, ainda que ao nível dos desempregados, por exemplo, metade dos quais não usufruem de qualquer fonte de rendimento ou prestação social, muito fique ainda por fazer.

Com este Orçamento, a vida da maioria das pessoas deverá melhorar, o que não pode deixar de ser elogiado. Foi, aliás, por se verificar que a resposta austeritária à crise tem confirmado ser parte fundamental do problema social e económico, e não da sua solução, que a esperança deu força às políticas alternativas: deter e reverter a operação de transferência de rendimentos do trabalho para o capital, e de recursos do público para o privado; defender o Estado social e os serviços públicos; promover o consumo interno, o investimento público, o crescimento e o emprego.

Nem todas estas linhas de orientação política têm, neste Orçamento, igual concretização. Muitas das reversões aos cortes do «ajustamento estrutural» são apenas parciais, outras avançam a conta-gotas, outras aguardam melhores dias. O investimento público e as políticas de desenvolvimento ficam aquém do necessário, sendo difícil imaginar como irão ocorrer reduções substanciais da taxa de desemprego ou alterações no desgraçado padrão de especialização produtiva do país. A reposição do horário de 35 horas na função pública ainda aguarda melhor definição, mas não pode deixar de ser vista como fundamental, até no quadro desta luta pelo tempo que caracteriza os combates sociais e que, por sua vez, liberta o tempo necessário aos combates futuros. A lógica de multiplicação de «tarifas sociais», como na electricidade, alivia, sem dúvida (diminuindo sofrimento) os esforços das camadas com mais dificuldades em pagar as facturas, mas deveria ser repensada no quadro mais amplo de como garantir a todos um verdadeiro acesso a algo que deve ser visto como um serviço público (e como tal administrado), evitando que a provisão pública se limite a criar remendos que, ainda por cima, confortam também os accionistas de empresas privadas. A proposta de alargamento da ADSE a cônjuges e filhos até aos 30 anos devia também suscitar um amplo debate na sociedade. É claro que não poderão ser prejudicados os direitos de quem descontou para este subsistema de saúde dos funcionários públicos – e até meados de 2010 isso nem era facultativo –, mas como não ter em conta o quanto ele tem contribuído para a destruição do Serviço Nacional de Saúde (SNS), seja alimentando lucros privados (pagos através do Estado), seja desaproveitando capacidades instaladas no SNS, seja afastando parte da população que poderia melhorá-lo?

Há ainda os outros debates, os que passam um pouco ao lado do Orçamento, como se previa tendo em conta que os acordos partidários assumiram o cumprimento das regras e dos tratados europeus, desde logo o Tratado Orçamental. Que questões são essas? Não são apenas os problemas globais de um sistema financeiro que usa os Estados para se recapitalizar. São também as exigências concretas e insustentáveis de uma dívida pública que é usada como instrumento de condicionamento político e como ameaça: quem ousar fazer uma reestruturação da dívida (prazos, montantes, juros) que inflija perdas aos credores corre o risco da saída do euro. Mas nada é dito, claro, sobre os riscos de tentar pagar a dívida ou de permanecer no euro.

Se as ameaças e imposições desta União Europeia em auto-decomposição chegarem ao ponto de obrigar o país a empobrecer com planos de «ajustamento estrutural» sem fim, destruindo os patamares de bem-estar social que uma vida digna exige, não será altura de responder a esta União, adaptando o que ouvimos nos filmes americanos, que «o Estado social não negoceia com terroristas»? E, para isso poder ser feito, não é necessário preparar seriamente esta hipótese, esse «plano B»?

Com efeito, não basta ficar à espera de passar os sucessivos orçamentos do Estado por entre os pingos da chuva desta Europa de dois pesos e duas medidas. É ela que decide o que aceita e o que recusa, independentemente das «regras»: desde 2011 que o governo anterior incumpriu as metas do défice, mas não deixou de ser considerado «o bom aluno português»; a França anunciou recentemente que não vai cumprir o défice, porque vai gastar o dinheiro com a guerra e com políticas securitárias, e isso não teve efeitos nenhuns; a Grã-Bretanha fala em sair da União e a resposta é um acordo sobre as exigências que o governo de David Cameron fez para defender, em referendo, a permanência… Mas esta dualidade de critérios da União Europeia é feitio, e não é necessariamente fraqueza.

Enquanto não dermos forma e força ao debate colectivo sobre tudo o que ficou para trás, das questões mais fáceis de resolver (como a reposição das 35 horas) às mais difíceis (como a reestruturação da dívida para libertar verbas para o Estado social e o emprego), não deixará de haver outros planos para substituir a actual maioria governativa. Aliás, os meios de comunicação social estão já a difundir amplamente o «plano B» das forças da direita. Trata-se da mesma receita austeritária que não funcionou, mas que está longe de ter sido derrotada nos campos ideológico e dos poderes económico, financeiro e mediático. Não é por acaso que Pedro Passos Coelho, recém-eleito líder do Partido Social Democrata, prossegue a sua campanha de reconquista eleitoral aconselhando o primeiro-ministro António Costa a avançar já com «medidas adicionais»para «dar confiança» a Bruxelas e aos mercados, isto é, com um «plano B» feito de «austeridade adicional». É altura de lhe mostrarmos que «planos B» há muitos…


domingo 13 de Março de 2016

"L'Union européenne est en train de s'écrouler" - Entrevista com Varoufakis



Il y a un mois, l’homme ayant tenu le rôle de ministre grec des Finances de janvier à mars 2015, Yanis Varoufakis, faisait son retour sur le devant de la scène. Il lançait un mouvement politique pour tenter de sauver une Europe menacée, selon lui, de désintégration sur fond de crise des réfugiés. L’iconoclaste économiste, chantre de l’anti-austérité, est désormais à la tête d’un mouvement paneuropéen qui veut agir pour plus de démocratie et de transparence. "L’Echo" l’a interrogé (par mail) sur cette Europe qu’il critique tant.

O Teatro e o Cinema estão de luto: Nicolau Breyner (1940/2016)