Chris Marker é um dos maiores cineastas vivos e mesmo um dos maiores da história da arte cinematográfica. Ao longo de quase seis décadas, Marker realizou dezenas de filmes e obras para televisão, curtas e curtíssimas, médias e longas e longuíssimas metragens, documentários e ficções. Viajante incessante é também o mais “invisível” dos cineastas, famoso por nunca dar entrevistas ou fazer aparições públicas. O seu amigo e cúmplice Alain Resnais disse: “Creio que se deve a Marker a introdução no cinema da forma do ensaio”. Já nos anos 50, de resto, André Bazin tinha tido a intuição: “Para ele o comentário de um filme não é o que se acrescenta à imagem mas quase o elemento primeiro, fundamental”. Cineasta profundamente “empenhado” acompanhando as lutas políticas ao longo do tempo e dos espaços (e há breves imagens de Portugal no imediato pós-25 de Abril em Le Fond de l’air est rouge e Sans Soleil), Marker foi elaborando a memória destes tempos. E no entanto os seus filmes não são estritamente do real imediato, do cinema como “janela aberta para o mundo” mas um processo de montagem, retomando a tradição dos soviéticos dos anos 20. Na montagem não há um tempo único mas vários estratos, o passado e o presente como também o futuro: no famoso La Jetée, feito com planos fixos, a memória de infância da personagem principal é afinal a sua própria morte. O cinema torna-se tempos, no plural. Como assinalou Raymond Bellour, Marker dá a ver que a característica maior do cinema não é tanto o movimento como o tempo. E isto na ficção científica de La Jetée ou Level 5 como nas memórias dos acontecimentos. Há autores que reinventam o cinema e Chris Marker é certamente um deles.
Augusto M. Seabra
De 2 a 6 de Dezembro na Culturgest
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