segunda-feira, 8 de abril de 2013

O MATERIAL TEM SEMPRE RAZÃO - José Pacheco Pereira


Um excelente José Pacheco Pereira
I
O Governo já tinha falhado por completo todos os objectivos do memorando, ANTES da decisão do Tribunal Constitucional. O governo já estava com dificuldades em "ir aos mercados", ANTES da decisão do Tribunal Constitucional. O Governo já estava a caminho de um segundo resgate, ANTES da decisão do Tribunal Constitucional. O Governo já estava em crise profunda, ANTES da decisão do Tribunal Constitucional. Todas as crises, económicas, sociais, e políticas já estavam em pleno curso, ANTES da decisão do Tribunal Constitucional.


II
A queda de Sócrates deu origem a uma pequena corte de viúvos e viúvas que passaram estes anos a tentar manter a memória do morto e a vingar-se de todas as maneiras dos seus assassinos. Agora estão muito contentes porque a RTP lhes deu uma mesa de pé de galo para falar com o morto e vice-versa. Esquecem-se que, em períodos como os que vivemos, até os mortos andam.

A queda previsível de Passos Coelho e a queda já efectiva de Relvas está a gerar o mesmo efeito: a criação de uma corte de viúvos e viúvas que também se preparam para carpir a "oportunidade perdida" de "mudar Portugal" e preparar a vendetta. Como os seus antecessores na viuvez, os blogues, o Twitter e as redes sociais são o seu terreno de eleição.

Ambos ajudaram a estragar Portugal até aos limites da ruína em que vivemos. Ambos pensam muito bem de si e acham que o povo não os merece. O nojo com que hoje olham para Portugal e os portugueses, uma ralé desqualificada cheia de vícios preguiçosos e de "direitos", é o seu melhor retrato. "Não nos merecem" é a inscrição que usam no seu brasão de lata.


III
O tom revanchista que o governo e os seus defensores assumem depois da decisão do Tribunal Constitucional , - do género "ai não quiseram isto, pois vão levar com muito mais", - mostra o carácter punitivo que está presente na política da coligação desde o início. A cada revés, e todas as semans há um grave revés, vêm novas ameaças e castigos, em vez de admissão de erros e inversão de caminhos. Como este tom punitivo é dos que melhor "comunica" com toda a gente, mesmo sem precisar de agências nem assessores, o governo está mais uma vez a semear ventos e a colher tempestades.


IV
A decisão do Tribunal Constitucional acelera todos estes processos mas não lhes deu origem. Nasceu deles. Nasceu de um Governo que, apesar de prevenido, mil vezes prevenido, insistiu num Orçamento de Estado assente em medidas ilegais. Bateu no peito cheio de ar e vento, insultando o Deus dos Trovões e levou com um raio em cima.

O número de artigos e notas em blogues que começam com “a decisão do Tribunal Constitucional fez e aconteceu….” representam um sucesso do pensamento único governamental. Na verdade, deviam começar com “a política do governo fez e aconteceu…” Isto, porque a decisão do Tribunal Constitucional é que é a normalidade e a lei, e a política do governo é que é a anormalidade e a ilegalidade. A decisão do Tribunal Constitucional representa uma consequência da política do governo, das escolhas do governo, da incapacidade do governo de encontrar políticas de contenção orçamental que não passem pela violação da lei e pelo afrontamento da Constituição.

Mais: o caminho seguido pelo governo para o objectivo de cumprimento do memorando da troika é que põe em causa esse cumprimento, porque não teve em conta qualquer preocupação em salvar um quantum da economia nacional, desprezou os efeitos sociais do “ir para além da troika”, não deu importância a qualquer entendimento social e político, vital em momentos de crise. Foi um caminho de pura engenharia social, económica e política, prosseguido com arrogância por uma mistura de técnicos alcandorados à infalibilidade com políticos de aviário, órfãos de cultura e pensamento, permeáveis a que os interesses instalados definissem os limites da sua política. Quiseram servir os poderosos com um imenso complexo de inferioridade social, e mostraram sempre (mostrou-o de novo o primeiro-ministro ontem), um revanchismo agressivo com os mais fracos.

Pensaram sempre em atacar salários, pensões, reformas, rendimentos individuais e das famílias, serviços públicos para os mais necessitados e nunca em rendas estatais, contratos leoninos, interesses da banca, abusos e cartéis das grandes empresas. Pode-se dizer que fizeram uma escolha entre duas opções, mas a verdade é que nunca houve opção: vieram para fazer o que fizeram, vieram para fazer o que estão a fazer.

Daqui.

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