Anseiam pela liberdade mas por enquanto enfrentam a discriminação, a violência e a prisão. Lutam por um futuro diferente pautado pela dignidade e pelo respeito dos seus direitos. Sabem que o caminho tem muitos obstáculos mas isso não os faz desistir.
É muito duro viver num país ocupado, sofrendo diariamente violações dos direitos humanos, detenções, torturas e maus tratos . Este país está submetido a um bloqueio militar e informativo.
O Sahara Ocidental está sob colonização há 40 anos por causa dos interesses económicos dos países aliados de Marrocos, como a França e Espanha.
Na minha opinião, os meios de comunicação social podiam e deviam ter um papel fundamental para romper este bloqueio informativo e assim mostrar ao mundo o que está a acontecer nesta região do mundo mas esta é uma zona fechada aos jornalistas e aos observadores independentes e somos nós que desempenhamos esse papel e por essa razão somos vítimas da violência das autoridades marroquinas.
Gostaria de pedir às instâncias internacionais que se empenhem mais na resolução deste conflito porque o povo saharaui não suporta mais sofrimento”. (Ahmed Ettanji, 28 anos, nasceu em El Aaiun, capital do Sahara Ocidental ocupado).
O que vou contar é tudo aquilo que se passou comigo desde os 7 anos quando andava na escola. Antes de entrar no estabelecimento de ensino obrigavam-nos a cantar o hino nacional marroquino e quando entravámos na sala de aulas o professor tratava-nos de forma diferente em relação aos meninos marroquinos, porque tinha uma atitude racista em relação a nós. Por causa dessa situação começamos logo em crianças a pensar porque é que existe essa diferença e aí nascem todas as dúvidas.
Na rua se uma marroquina discute com uma saharaui, a marroquina chama-lhe logo "saharaui, a suja da Polisário". As ruas estão sempre cheias de militares e policias à paisana. A partir daqui vamo-nos apercebendo que a nossa terra está ocupada. Percebes também que todas as famílias saharauis têm um membro da família que está preso ou desaparecido.
Quando passei para a escola secundária as coisas mudaram. Um dia o professor disse-me: "Se faltares à escola, não há problema, eu dou-te na mesma uma boa nota". Mas ele dizia isso para que eu não tivesse estudos e cultura, como fez Hassan II com os saharauis em 1988 e 1989 levando-os para o Norte de Marrocos. Se tivessem estudado, poderiam ter sido engenheiros ou jornalistas, mas Hassan II destruiu-lhes a vida hipotecando-lhes desde muito cedo o futuro.
Esta política é exercida por Marrocos com os saharauis desde que ocupou o Sahara em 1975. Desde essa altura percebemos que Marrocos não quer que os saharauis tenham cultura, nem estudos e nenhum cargo importante na sua terra.
Esta situação manteve-se até 2005, quando não podias dizer que eras saharaui nem mesmo perguntar por algum filho que estivesse preso. A partir desse ano, no entanto, as coisas mudaram e começaram as Intifadas, as manifestações e as concentrações e o regime marroquino teve de se habituar a viver com esta situação.
Eu fui preso conjuntamente com outros jovens seis dias depois da Intifada da Indepedência que ocorreu em maio de 2005. Fomos torturados de uma forma horrível. A mim, partiram-me o braço esquerdo. Nao me prestaram assistência médica. Continuaram a torturar-me de uma forma que não consigo explicar... Fui vendado e algemado, torturaram-me na esquadra. Pedi para me levarem ao médico porque precisava de uma operação, mas não deixaram.
Ainda na esquadra da polícia, continuaram a torturar-me e a interrogar-me. Fui julgado e condenado a quatro anos de prisão. Estive 25 dias na “Carcel Negra” e graças a muitas concentrações e apoios da minha família e do povo em geral, levaram-me para o hospital, onde fui operado para me colocarem uma peça de metal no braço. Passei dois meses no hospital com uma mão engessada e a outra alegamada à cama e por isso não me conseguia mexer.
Ao fim de nove meses de prisão e graças à pressão exercida por várias organizações internacionais que apoiam o povo saharaui, saímos em liberdade.
Desde esse momento vivo permanentemente vigiado e tentam intimidar-me, seja na rua ou no café. A casa da minha família também está vigiada bem como a de todos os meus compatriotas.
A situação mudou e El Aaiun passou a estar cercada, como se fosse uma zona militar. Por este, oeste, sul e norte...enfim em todo o lado. Até em frente às escolas há militares, os meninos de sete anos entram e saem da escola vigiados por militares. (Husein Endour, 37 anos, nasceu na cidade de El Aaiun).
Os meus sentimentos asfixiam-me e a esmagadora maioria das pessoas no meu país está como eu e sente o mesmo. E isso explica bem o domínio que o regime marroquino exerce sobre nós não nos deixando sequer crescer em termos demográficos. Pessoalmente, não sinto ódio nem vontade de vingança contra os marroquinos, mas estou naturalmente contra a ocupação Sahara Ocidental.
Penso que a descolonização ainda não se fez por falta de vontade política da comunidade internacional que não obriga as autoridades marroquinas a ter respeito pela liberdade do nosso povo por causa dos interesses estratégicos e económicos que alguns países membros do Conselho de Segurança da ONU têm com Marrocos.
O papel dos meios de comunicação social é muito importante para dar visibilidade à nossa causa. Se a nível internacional a opinião pública estiver bem informada sobre aquilo se passa terá capacidade para influenciar o curso dos acontecimentos levando a que os Governos dos seus países deixem de apoiar Marrocos. Neste momento, estamos ainda cercados por um muro feito de indiferença.
Sou ativista da causa saharaui e acredito que o futuro será bom se Marrocos cumprir os seus compromissos e deixar o povo decidir livremente através de um referendo justo e transparente.
Em relação à comunidade internacional lamento que ao fim de 26 anos de presença da MINURSO no Sahara Ocidental não se vejam ainda resultados positivos e também por isso os saharauis continuam em sofrimento seja porque muitos são obrigados a viver separados dos seus familiares ou porque se sentem indignados com o roubo dos bens da sua terra. Precisamos de ser respeitados e por isso peço que ajudem este povo que age com princípios. (Amina, 43 anos, nasceu e Ouarzazate e vive em El Aaiun).
“É preciso mostrar o rosto ensanguentado da monarquia totalitária marroquina”
A maioria dos marroquinos são utensílios da ocupação marroquina com os civis forçados a estar na linha da frente. Marrocos criou um estado de ódio mútuo entre marroquinos e saharauis
E isto acontece porque a França não tem garantidos os seus objetivos económicos e estratégicos, e também porque o status-quo existente até ao momento define o nosso futuro. Por outro lado, há ainda que ter em conta a falta de seriedade dos membros não-permanentes do Conselho de Segurança das Nações Unidas, mais concretamente o grupo de amigos dos responsáveis máximos da ONU para o Sahara Ocidental.
É bom que se saiba também que a maioria dos órgãos de informação têm medo de mostrar a realidade; daí a proibição de entrada de jornalistas e observadores que não estão comprometidos com a colonização.
A imprensa que não está prisioneira tem ajudado a mostrar o rosto ensanguentado da monarquia totalitário marroquina. Assim, precisamos de meios que consigam chegar ao interior dos centros de tortura e às prisões para que as práticas desumanas dos torturadores marroquinos contra os presos políticos saharauis não continuem a ser escondidas.
Em relação ao futuro, penso na paz e liberdade do povo saharaui e ao mesmo tempo na guerra que vai deixar tantos órfãos, viúvas e tragédias para os saharauis e para os marroquinos porque os únicos que tiram proveito desta tragédia são o rei e aqueles que gravitam à sua volta.
Perante a realidade que vivemos, espero que a comunidade internacional e as Nações Unidas façam uma autocrítica sobre a forma como têm tratado a questão do Sahara Ocidental, e não continuem reféns da enganosa publicidade e atitude de Marrocos - falsidades tais como a CORCAS e comités regionais dos " direitos humanos " - e, finalmente, a mentira do investimento e desenvolvimento no Sahara Ocidental. É preciso dizer que estas iniciativas são uma farsa destinada a prolongar a ocupação e a pilhagem dos recursos naturais do povo. (Sidi Mohamed Fadel Bakka, 42 anos, vive em El Aaiun).
Via esquerda.net
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