sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

"Lisboa" - poema de Fernando Pessoa

Accordar da cidade de Lisboa, mais tarde do que as outras,
Accordar da rua do Ouro,
Accordar do Rocio, às portas dos cafés,
Accordar,
E no meio de tudo a gare, a gare que nunca dorme,
Como um que tem que pulsar através da vigília e do somno.

Toda a manhã que raia, raia sempre no mesmo logar,
Não há manhãs sobre cidades, ou manhãs sobre o campo.
À hora em que o dia raia, em que a luz estremece a erguer-se
Todos os logares são o mesmo logar, todas as terras são a mesma,
E é eterna e de todos os logares a frescura que sobe por tudo
E

Uma espiritualidade feita com a nossa própria carne,
Um alívio de viver de que o nosso corpo partilha,
Um enthusiasmo por o dia que vai vir, uma alegria
por o que pode acontecer de bom,
São os sentimentos que nascem de estar olhando para a madrugada,
Seja ella a leve senhora dos cumes dos montes,
Seja ella a invasora lenta das ruas das cidades que vão leste-oeste,
Seja


Fernando Pessoa

"Ojos verdes" - Buika

"Turiya And Ramakrishna" - Alice Coltrane

Barragem do Tua: Relatório do ICOMOS/UNESCO


O relatório da ICOMOS escondido pelo governo

quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

"Lisboa" - poema de Alberto d'Oliveira


Ó Cidade da Luz! Perpétua fonte
De tão nítida e virgem claridade,
Que parece ilusão, sendo verdade,
Que o sol aqui feneça e não desponte....

Embandeira-se em chamas o horizonte:
Um fulgor áureo e róseo tudo invade:
São mil os panoramas da Cidade,
Surge um novo mirante em cada monte.

Ó Luz ocidental, mais que a do Oriente
Leve, esmaltada, pura e transparente,
Claro azulejo, madrugada infinda!

E és, ao sol que te exalta e te coroa,
- Loira, morena, multicor Lisboa! -
Tão pagã, tão cristã, tão moira ainda...


Alberto d'Oliveira

Clássicos do Cinema - "On Dangerous Ground"



Realização de Nicholas Ray


On Dangerous Ground (1952) por goosgoosduck

Um dos filmes mais perturbantes de Nicholas Ray, cujo centro é o encontro entre um polícia violento e uma jovem cega que vive numa casa isolada, casulo protetor para ela e o seu irmão adolescente, que será objeto de uma brutal caça ao homem.

On Dangerous Ground é antes de mais um filme sobre o conflito entre o ver, o não ver, e o acreditar.

Um filme entre o preto (não ver) e o branco (ver).

Vi 3ª feira

Alves Redol - 100 anos

"Lisboa e o país precisam do Cinema Odeon" - Petição

O Cinema Odéon, sito na Rua dos Condes, Nº 2-20, Freguesia de São José, data de 21 de Setembro de 1927 e é hoje o cinema com mais história de Lisboa, tendo passado pela sua tela clássicos do mudo e do sonoro (Stroeheim, Lang, Tod Browning, Eisenstein, Cukor, Capra, etc.), e, já a partir da segunda metade do séc. XX grandes êxitos do cinema português e espanhol, bem como teatro radiofónico, protagonizado por Laura Alves, Madalena Iglésias, Antonio Calvário, entre muitos outros.

O conjunto da sala, com 84 anos, formado pelo tecto de madeira tropical aparente (único no mundo, espantosamente intacto depois de 16 anos de abandono); pelo lustre de néons gigantes irrradiantes (peças electro-históricas), que uma longa corrente vertical, comandada do tecto, faz deslizar até ao chão para manutenção; pelo luxuriante palco com moldura e frontão em relevo Art Deco (outro caso único); pela complexa teia de palco, com o seu pano de ferro; e pela série de camarotes (onde Salazar tinha lugar cativo), galerias e balcões em andares, tudo isto forma um exemplar assinalável, mais ainda por ser o último do género existente em Portugal.

O Cinema Odéon esteve em vias de classificação como Imóvel de Interesse Público de 2004-2009, altura em que o processo foi arquivado pelo Igespar. Neste momento, e não existindo nenhuma classificação municipal, mantém-se apenas a ténue protecção de estar inserido no perímetro de classificação do conjunto da Avenida da Liberdade como de Interesse Público, cujo processo de classificação, também da responsabilidade do Igespar, terminará em 31 de Dezembro de 2011.

O Cinema Odéon está fechado e à venda desde meados da década de 90, sendo que por força dessa circunstância e da verificada falta de obras de conservação, as suas galerias metálicas, as suas fachadas (sobretudo a tardoz) e a clarabóia no telhado, necessitam de obras.

Recentemente, terá sido aprovada pela Câmara Municipal de Lisboa, uma informação prévia conducente à transformação do Odéon em centro comercial e estacionamento subterrâneo para automóveis, apontando-se como elementos a preservar o seu tecto de madeira e o frontão de palco, ainda que em local a considerar; tornando assim irreversível a não reutilização do Odéon enquanto cinema e/ou teatro.

Mas o seu futuro e preservação coerente e responsável não se compadece com o aleatório de "manter a cobertura e a fachada" - que uma obra em profundidade, como a que se anuncia (dois pisos subterrâneos!) destruirá inevitavelmente - nem é suficiente essa preservação "da pele", sem o poderoso miolo. O que se pode/deve fazer - seguindo o exemplo do vizinho Condes mas em melhor; ou o de El Ateneo Grand Splendid, de Buenos Aires, que virou uma extraordinária livraria - é aproveitar o vazio da sala (se não for possível a sua permanência enquanto cinema e/ou teatro), mantendo as suas estrutura e elementos, para uma cuidada e inventiva reutilização em novas funções à altura dos valores reais num re-uso que não destrua a "galinha dos ovos de ouro" que salta à vista (a sala, o lustre, o palco e a sua teia, etc) - antes tire partido dela se a sua recuperação for conseguida, garantindo a reversibibilidade da eventual transformação.

Confrange ver os investidores e responsáveis institucionais e municipais - que deviam ter uma abordagem e perspectiva, precisamente por estarmos em plena época de crise, de procurar transformar dificuldades em oportunidades - sem qualquer visão ou uma inteligência operativa, neste caso derradeiro de possibilidade de manter um espaço arquitectónico, notabilissimo e único, vivo!

Os abaixo assinados, tendo em conta ainda a perda irreparável que foi para esta cidade o desaparecimento de outras salas igualmente míticas (ex. Monumental e Éden) apelam a quem de direito, i.e. ao Governo, à Câmara Municipal de Lisboa, a todos os Agentes Culturais e de Entretenimento desta cidade, e aos cidadãos em geral, para que em conjunto se encontre uma solução para o Cinema Odéon, que dignifique a cidade, o país e o nosso património.

Os abaixo assinados


Assinar aqui

quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

Será que vamos continuar a pôr a cabeça debaixo da areia?

O mapa-mundo das maiores economias está a deixar de ser o que era e, na próxima década, ficará com uma configuração bem diferente da actual.

Exposição cancelada

O Museu de Arte para Crianças em Oakland (MOCHA) decidiu cancelar uma exposição de desenhos de crianças palestinianas da Faixa de Gaza. Veja alguns dos desenhos censurados.







"99% Choir Forecloses on Bank of America"

Uma excelente celebração!

"SAKINEH — FAIR TRIAL OR SHOW TRIAL?"

We, the undersigned, call for
THE IMMEDIATE RELEASE Of SAKINEH MOHAMMADI ASHTIANI

The world is aware there is no legal basis for the execution of Sakineh by stoning or by hanging, or for her imprisonment. Her barbaric sentence for adultery, following the murder of her husband by criminals subsequently convicted, is not based on evidence as the judiciary acknowledges, now was it ever specified with whom she committed alleged adultery. She was forced to make a confession under extreme duress, which she retracted during the trial.

Now, Sakineh’s 22-year-old son, Sajad has been arrested, with his lawyer Houtan Kian for appealing for the release of his mother.

We call for
THE IMMEDIATE RELEASE OF SAKINEH ASHTIANI’S SON, SAJAD

Sajad has maintained at all times that his mother is fully innocent. He has bravely spoken up in her defence at the risk of his own life. His only crime: that of being a good son. By cutting off Sajad and his lawyer from the outside world the authorities are attempting to silence those who could inform Iranians and the world of the truth of Sakineh's unjust sentence. Confessions recently obtained from Sajad and Kian have no legitimacy since they have had no access to anyone since they were arrested on October 10.

We call upon Ayatollah Ali Khamenei and the leaders of Iran to take responsibility for their commitments as a signatory to the International Declaration of Human Rights and related Conventions. And to demand that the Eastern Azerbaijan judiciary free Sakineh, her young son Sajad, and his lawyer, Houtan Kian.

Assine aqui!

Voltamos a Sakineh


Sakineh pode ser apredejada até à morte a qualquer momento



terça-feira, 27 de dezembro de 2011

Marlene Dietrich - 110 anos







Marlene Dietrich nasceu há 110 anos

"Image of the day" - 26/12/2011

The city lights of Spain and Portugal define the Iberian Peninsula in this photograph from the International Space Station (ISS). Several large metropolitan areas are visible, marked by their relatively large and brightly lit areas, including the capital cities of Madrid, Spain—located near the center of the peninsula’s interior—and Lisbon, Portugal—located along the southwestern coastline. The ancient city of Seville, visible to the north of the Strait of Gibraltar, is one of the largest cities in Spain. The astronaut view is looking toward the east, and is part of a time-lapse series of images.

The network of smaller cities and towns along the coastline and in the interior attest to the extent of the human presence on the Iberian landscape. The blurring of city lights is caused by thin cloud cover (image left and center), while cloud tops are dimly illuminated by moonlight. Though obscured, the lights of France are visible near the horizon line on the upper left, while the lights of northern Africa are more clearly discernable at right. The faint gold and green line of airglow—caused by ultraviolet radiation exciting the gas molecules in the upper atmosphere—parallels the horizon (or Earth limb).

The Iberian Peninsula is the southwestern-most of the European peninsulas (together with the Italian and Balkan peninsulas), and includes the Principality of Andorra, as well as the Kingdom of Spain and the Portuguese Republic. The approximately 590,000 square kilometer landmass is bounded by the Atlantic Ocean to the northwest, west, and southwest and the Mediterranean Sea to the east. Its northeastern boundary is marked by the Pyrenees mountain range.

Astronaut photograph ISS030-E-10008 was acquired on December 4, 2011, with a Nikon D3S digital camera using a 24 mm lens, and is provided by the ISS Crew Earth Observations experiment and Image Science & Analysis Laboratory, Johnson Space Center. The image was taken by the Expedition 30 crew. The image has been cropped and enhanced to improve contrast. Lens artifacts have been removed. The International Space Station Program supports the laboratory as part of the ISS National Lab to help astronauts take pictures of Earth that will be of the greatest value to scientists and the public, and to make those images freely available on the Internet. Additional images taken by astronauts and cosmonauts can be viewed at the NASA/JSC Gateway to Astronaut Photography of Earth. Caption by William L. Stefanov, Jacobs Technology/ESCG at NASA-JSC.
Instrument: ISS - Digital Camera

Os sinais da desconfiança!

Emigrantes estão a retirar verbas elevadas dos bancos portugueses

segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

"Para sair da crise, é preciso “romper com a troika” e obrigá-la a “renegociar a dívida”"

Éric Toussaint não está optimista, mas tem uma visão diferente da actual crise e do que fazer para sair dela.

Não!

L'Iranienne Sakineh, condamnée à la lapidation, pourrait être pendue

Portugal é possível! - Pedro Gadanho

Arquitecto português foi escolhido num concurso internacional lançado pelo museu de Nova IorqueArquitecto português foi escolhido num concurso internacional lançado pelo museu de Nova Iorque

Entrevista a Pedro Gadanho

"Christmas Palestine 2011"

Brasil passou a 6º

UK relegated to seventh place in world league of leading economies in 2011, according to team of economists

Natal na Rússia

Rússia: Milhares de pessoas exigem na rua realização de novas eleições

quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

As estranhas posições do PCP

Estes dois homens morreram com um dia de diferença.

Qual a diferença entre os dois?

Kim Jong-II foi um ditador e um sanguinário. O povo norte coreano morre de fome, não sabe o que é a liberdade de falar ou, sequer, de pensar.

Václav Havel foi um lutador pela liberdade. Tornou-se um ícone da Revolução de Veludo no seu país, em 1989. Em 29 de dezembro de 1989, na qualidade de chefe do Fórum Cívico, foi eleito presidente da Checoslováquia pelo voto unânime da Assembleia Federal.

As posições do PCP face à morte destes dois homens é verdadeiramente extraordinária:

Relativamente a Kim Jong-II emitiu uma nota de pesar em que reafirma nesta ocasião a sua posição de respeito e solidariedade para com a soberania da República Popular Democrática da Coreia – RPDC, o direito que lhe assiste a determinar o seu rumo próprio de desenvolvimento em condições de paz e não ingerência nos seus assuntos internos, e o objectivo da reunificação pacífica da nação coreana.

Felizmente que, na época da ditadura portuguesa houve quem tomasse posição a favor da democracia em Portugal. Nessa altura de certeza que o PCP não achou que havia ingerência nos assuntos internos portugueses.


Relativamente a Václav Havel, o PCP votou contra voto de pesar na Assembleia da República, sendo que Jerónimo de Sousa saiu da sala na altura da votação.

Como é possível que um partido que diz defender a democracia e os direitos humanos continue a ter relações com um partido monárquico que dirige uma, se não a maior, das piores ditaduras do mundo e, ao mesmo tempo, porque há anos sem fim teve uma posição infeliz relativamente à Checoslováquia, não tenha pesar por um lutador pela liberdade?

Pela minha parte, envio as minhas condolências ao povo norte coreano que vai continuar a viver um pesadelo e ao povo da República Checa que perdeu um homem da liberdade e da democracia.

Assim vai a Europa! - "Ministro da Defesa espanhol vendia bombas de fragmentação"

Não me parece que Mariano Rajoy comece bem:

O novo ministro da Defesa espanhol, Pedro Morenés Eulate, foi representante, até ao mês passado, da empresa Instalaza S.A., fabricante de bombas de fragmentação até 2008. Estas bombas foram usadas pelas forças leais ao ditador líbio Muammar Kadhafi contra a população civil. Morenés é ainda diretor executivo em Espanha da empresa MBDA que desenha, fabrica e vende mísseis.

"Fado interpretado por Camané em "José & Pilar" pré-nomeado para os Oscars"



A China e a EDP



Quem são?

"O mundo em 2011 revisto em imagens"

Uma excelente recolha de Rui Silva na TSF

terça-feira, 20 de dezembro de 2011

"Carta aberta ao Senhor Primeiro Ministro"

Exmo Senhor Primeiro Ministro

Começo por me apresentar, uma vez que estou certa que nunca ouviu falar de mim. Chamo-me Myriam. Myriam Zaluar é o meu nome "de guerra". Basilio é o apelido pelo qual me conhecem os meus amigos mais antigos e também os que, não sendo amigos, se lembram de mim em anos mais recuados.

Nasci em França, porque o meu pai teve de deixar o seu país aos 20 e poucos anos. Fê-lo porque se recusou a combater numa guerra contra a qual se erguia. Fê-lo porque se recusou a continuar num país onde não havia liberdade de dizer, de fazer, de pensar, de crescer. Estou feliz por o meu pai ter emigrado, porque se não o tivesse feito, eu não estaria aqui. Nasci em França, porque a minha mãe teve de deixar o seu país aos 19 anos. Fê-lo porque não tinha hipóteses de estudar e desenvolver o seu potencial no país onde nasceu. Foi para França estudar e trabalhar e estou feliz por tê-lo feito, pois se assim não fosse eu não estaria aqui. Estou feliz por os meus pais terem emigrado, caso contrário nunca se teriam conhecido e eu não estaria aqui. Não tenho porém a ingenuidade de pensar que foi fácil para eles sair do país onde nasceram. Durante anos o meu pai não pôde entrar no seu país, pois se o fizesse seria preso. A minha mãe não pôde despedir-se de pessoas que amava porque viveu sempre longe delas. Mais tarde, o 25 de Abril abriu as portas ao regresso do meu pai e viemos todos para o país que era o dele e que passou a ser o nosso. Viemos para viver, sonhar e crescer.

Cresci. Na escola, distingui-me dos demais. Fui rebelde e nem sempre uma menina exemplar mas entrei na faculdade com 17 anos e com a melhor média daquele ano: 17,6. Naquela altura, só havia três cursos em Portugal onde era mais dificil entrar do que no meu. Não quero com isto dizer que era uma super-estudante, longe disso. Baldei-me a algumas aulas, deixei cadeiras para trás, saí, curti, namorei, vivi intensamente, mas mesmo assim licenciei-me com 23 anos. Durante a licenciatura dei explicações, fiz traduções, escrevi textos para rádio, coleccionei estágios, desperdicei algumas oportunidades, aproveitei outras, aprendi muito, esqueci-me de muito do que tinha aprendido.

Cresci. Conquistei o meu primeiro emprego sozinha. Trabalhei. Ganhei a vida. Despedi-me. Conquistei outro emprego, mais uma vez sem ajudas. Trabalhei mais. Saí de casa dos meus pais. Paguei o meu primeiro carro, a minha primeira viagem, a minha primeira renda. Fiquei efectiva. Tornei-me personna non grata no meu local de trabalho. "És provavelmente aquela que melhor escreve e que mais produz aqui dentro." - disseram-me - "Mas tenho de te mandar embora porque te ris demasiado alto na redacção". Fiquei.

Aos 27 anos conheci a prateleira. Tive o meu primeiro filho. Aos 28 anos conheci o desemprego. "Não há-de ser nada, pensei. Sou jovem, tenho um bom curriculo, arranjarei trabalho num instante". Não arranjei. Aos 29 anos conheci a precariedade. Desde então nunca deixei de trabalhar mas nunca mais conheci outra coisa que não fosse a precariedade. Aos 37 anos, idade com que o senhor se licenciou, tinha eu dois filhos, 15 anos de licenciatura, 15 de carteira profissional de jornalista e carreira 'congelada'. Tinha também 18 anos de experiência profissional como jornalista, tradutora e professora, vários cursos, um CAP caducado, domínio total de três línguas, duas das quais como "nativa". Tinha como ordenado 'fixo' 485 euros x 7 meses por ano. Tinha iniciado um mestrado que tive depois de suspender pois foi preciso escolher entre trabalhar para pagar as contas ou para completar o curso. O meu dia, senhor primeiro ministro, só tinha 24 horas...

Cresci mais. Aos 38 anos conheci o mobbying. Conheci as insónias noites a fio. Conheci o medo do amanhã. Conheci, pela vigésima vez, a passagem de bestial a besta. Conheci o desespero. Conheci - felizmente! - também outras pessoas que partilhavam comigo a revolta. Percebi que não estava só. Percebi que a culpa não era minha. Cresci. Conheci-me melhor. Percebi que tinha valor.

Senhor primeiro-ministro, vou poupá-lo a mais pormenores sobre a minha vida. Tenho a dizer-lhe o seguinte: faço hoje 42 anos. Sou doutoranda e investigadora da Universidade do Minho. Os meus pais, que deviam estar a reformar-se, depois de uma vida dedicada à investigação, ao ensino, ao crescimento deste país e das suas filhas e netos, os meus pais, que deviam estar a comprar uma casinha na praia para conhecerem algum descanso e descontracção, continuam a trabalhar e estão a assegurar aos meus filhos aquilo que eu não posso. Material escolar. Roupa. Sapatos. Dinheiro de bolso. Lazeres. Actividades extra-escolares. Quanto a mim, tenho actualmente como ordenado fixo 405 euros X 7 meses por ano. Sim, leu bem, senhor primeiro-ministro. A universidade na qual lecciono há 16 anos conseguiu mais uma vez reduzir-me o ordenado. Todo o trabalho que arranjo é extra e a recibos verdes. Não sou independente, senhor primeiro ministro. Sempre que tenho extras tenho de contar com apoios familiares para que os meus filhos não fiquem sozinhos em casa. Tenho uma dívida de mais de cinco anos à Segurança Social que, por sua vez, deveria ter fornecido um dossier ao Tribunal de Família e Menores há mais de três a fim que os meus filhos possam receber a pensão de alimentos a que têm direito pois sou mãe solteira. Até hoje, não o fez.

Tenho a dizer-lhe o seguinte, senhor primeiro-ministro: nunca fui administradora de coisa nenhuma e o salário mais elevado que auferi até hoje não chegava aos mil euros. Isto foi ainda no tempo dos escudos, na altura em que eu enchia o depósito do meu renault clio com cinco contos e ia jantar fora e acampar todos os fins-de-semana. Talvez isso fosse viver acima das minhas possibilidades. Talvez as duas viagens que fiz a Cabo-Verde e ao Brasil e que paguei com o dinheiro que ganhei com o meu trabalho tivessem sido luxos. Talvez o carro de 12 anos que conduzo e que me custou 2 mil euros a pronto pagamento seja um excesso, mas sabe, senhor primeiro-ministro, por mais que faça e refaça as contas, e por mais que a gasolina teime em aumentar, continua a sair-me mais em conta andar neste carro do que de transportes públicos. Talvez a casa que comprei e que devo ao banco tenha sido uma inconsciência mas na altura saía mais barato do que arrendar uma, sabe, senhor primeiro-ministro. Mesmo assim nunca me passou pela cabeça emigrar...

Mas hoje, senhor primeiro-ministro, hoje passa. Hoje faço 42 anos e tenho a dizer-lhe o seguinte, senhor primeiro-ministro: Tenho mais habilitações literárias que o senhor. Tenho mais experiência profissional que o senhor. Escrevo e falo português melhor do que o senhor. Falo inglês melhor que o senhor. Francês então nem se fale. Não falo alemão mas duvido que o senhor fale e também não vejo, sinceramente, a utilidade de saber tal língua. Em compensação falo castelhano melhor do que o senhor. Mas como o senhor é o primeiro-ministro e dá tão bons conselhos aos seus governados, quero pedir-lhe um conselho, apesar de não ter votado em si. Agora que penso emigrar, que me aconselha a fazer em relação aos meus dois filhos, que nasceram em Portugal e têm cá todas as suas referências? Devo arrancá-los do seu país, separá-los da família, dos amigos, de tudo aquilo que conhecem e amam? E, já agora, que lhes devo dizer? Que devo responder ao meu filho de 14 anos quando me pergunta que caminho seguir nos estudos? Que vale a pena seguir os seus interesses e aptidões, como os meus pais me disseram a mim? Ou que mais vale enveredar já por outra via (já agora diga-me qual, senhor primeiro-ministro) para que não se torne também ele um excedentário no seu próprio país? Ou, ainda, que venha comigo para Angola ou para o Brasil por que ali será com certeza muito mais valorizado e feliz do que no seu país, um país que deveria dar-lhe as melhores condições para crescer pois ele é um dos seus melhores - e cada vez mais raros - valores: um ser humano em formação.

Bom, esta carta que, estou praticamente certa, o senhor não irá ler já vai longa. Quero apenas dizer-lhe o seguinte, senhor primeiro-ministro: aos 42 anos já dei muito mais a este país do que o senhor. Já trabalhei mais, esforcei-me mais, lutei mais e não tenho qualquer dúvida de que sofri muito mais. Ganhei, claro, infinitamente menos. Para ser mais exacta o meu IRS do ano passado foi de 4 mil euros. Sim, leu bem, senhor primeiro-ministro. No ano passado ganhei 4 mil euros. Deve ser das minhas baixas qualificações. Da minha preguiça. Da minha incapacidade. Do meu excedentarismo. Portanto, é o seguinte, senhor primeiro-ministro: emigre você, senhor primeiro-ministro. E leve consigo os seus ministros. O da mota. O da fala lenta. O que veio do estrangeiro. E o resto da maralha. Leve-os, senhor primeiro-ministro, para longe. Olhe, leve-os para o Deserto do Sahara. Pode ser que os outros dois aprendam alguma coisa sobre acordos de pesca.

Com o mais elevado desprezo e desconsideração, desejo-lhe, ainda assim, feliz natal OU feliz ano novo à sua escolha, senhor primeiro-ministro

e como eu sou aqui sem dúvida o elo mais fraco, adeus

Myriam Zaluar, 19/12/2011

A carta aberta da Myriam Zaluar publicada no Facebook ontem já teve, até agora, 1.975 partilhas.

"Ainda esta semana"

Que honra é esta que sobrepõe o dever de pagamento da dívida aos ricos ao dever de alimentar os pobres?

São umas vinte e vão todas em fila indiana, de mãos dadas como se estivessem numa roda, com os seus bibes vermelhos, todas com chapéus na cabeça, com uma professora a abrir o cortejo, outra no meio, outra a fechar. Está frio à sombra, mas o sol aquece e a fila avança alegremente pelo Parque das Nações, em direcção ao Pavilhão do Conhecimento, ou talvez ao Oceanário. Terão uns cinco ou seis anos, riem-se, saltitam e chilreiam sem parar. A imagem é banal mas é assim. As crianças desta idade chilreiam como passarinhos. As professoras estão sérias, com a linguagem corporal da decisão e da atenção, a dar instruções, a contar as crianças, a vigiar os perigos, carros que podem aparecer, uma criança tresmalhada, o chapéu que voa, mas as crianças chilreiam despreocupadas. Vão passear, está um dia lindo, têm camisolas debaixo dos bibes para o frio e um chapéu na cabeça para o sol, estão com os amigos, alguém as conduz, as protege, lhes vai dar o almoço, o lanche, talvez guloseimas, uns carinhos, um penso se esfolarem o joelho. Vão abrir os olhos de surpresa, de alegria, de excitação. Paro no passeio a olhar as crianças que chilreiam. Tudo na sua atitude denota a segurança da confiança. Está tudo bem. Os adultos sabem. É só dar a mão.

E se não soubéssemos? Se os adultos não soubessem? Se não fizéssemos a mínima ideia do que estamos a fazer? Ou se a esmagadora maioria de nós tivesse desistido de compreender, de agir, de melhorar o mundo, de viver, de qualquer outra coisa que não fosse o que se passa na nossa sala de estar? E se houvesse apenas alguns, poucos, que soubessem o que se passa no mundo e que tivessem poder para intervir e se esses se estivessem a borrifar para a fila de crianças de bibe vermelho que avança a chilrear pelo Parque das Nações?
O que podemos prometer hoje a estas crianças? Que o seu mundo vai ser mais seguro que o nosso? Mais livre? Mais solidário? Mais feliz? Mais bonito? Mais humano? Mais criativo? O que podemos prometer nesta semana de Natal às filas de crianças de bibe vermelho de Atenas, de Madrid, de Dublin, ou de Amesterdão e de Berlim?

Não há nada, absolutamente nada, tristemente nada, que sinta que o Governo do meu país está a fazer pelas crianças de bibe vermelho. O mundo que lhes está prometido é um mundo de menor liberdade, de menor conforto, de menos trabalho, de menos segurança, de menos saúde, de menos educação, de menos acesso à cultura, de menos cidadania, de menos humanidade, de menos respeito pelos outros e pela Natureza. De mais desigualdade, de mais competitividade, de mais violência, de miséria. Não apenas para o ano ou para o ano seguinte, mas para os próximos dez anos, vinte anos, para sempre.

Para o Governo do meu país, os financeiros sem rosto que sobem os juros da dívida que dizem que temos são mais importantes que as crianças de bibe vermelho. Ainda que esses financeiros sem rosto tenham roubado os títulos da dívida a alguém, ainda que os tenham forjado, ainda que tenham sido eles a convencer os governantes a reduzir os impostos às empresas para depois termos de lhes pedir dinheiro emprestado, ainda que nos cobrem um juro agiota, ainda que subam o seu juro agiota sem razão, ainda que condenem à miséria crianças de bibe vermelho por todo o mundo, ainda que condenem a morrer à fome crianças que nem sequer têm um bibe vermelho. Que honra é esta que sobrepõe o dever de pagamento da dívida aos ricos ao dever de alimentar os pobres? Que honra é esta que aceita aumentos de juros de 7 por cento para as dívidas que se devem aos ricos mas apenas um aumento de 3 por cento para as pensões dos mais pobres dos pobres? Não é nenhuma honra. É apenas indignidade. É apenas falta de vergonha. É apenas desumanidade.

A mecanização e a informatização permitiu dispensar milhões de trabalhadores e os pobres deixaram de fazer falta. Mais: são acusados de ser a causa da crise. Desempregados que consomem subsídios, doentes que consomem medicamentos, velhos que consomem pensões, grávidas que consomem licenças de maternidade, parasitas todos. Solidariedade? Apenas um obstáculo a contornar no caminho da produtividade. Mas há soluções para reduzir o parasitismo. Basta ir reduzindo o Estado social que o alimenta e que, de qualquer forma, não temos dinheiro para pagar. Sim, porque depois de pagar a dívida aos bancos não sobra nada.

O discurso hegemónico é simples e condena as crianças de bibe vermelho à vida triste que já vivemos há quarenta anos, como lembrava há dias Isabel do Carmo.

Mas enquanto via a fila de crianças de bibe vermelho avançar à beira-Tejo, sem poder deixar de sorrir parvamente, como não podemos deixar de fazer quando vemos uma fila de crianças de bibe vermelho a chilrear como se o mundo não admitisse uma única preocupação, tive a certeza que nada disto ia acontecer, porque não era possível ver uma fila de crianças de bibe vermelho e deixar que isto acontecesse. Não era possível que o mundo que lhes vamos deixar fosse esta apagada e vil tristeza. E pensei na quantidade de gente que, em Portugal e no resto da Europa e no resto do mundo se mobiliza para que isso não aconteça, nos movimentos cívicos, nas artes, nos partidos e nas organizações religiosas. Já começámos a perceber como funciona o sistema da dívida, a armadilha dos juros crescentes, a matilha de agências de rating e dos bancos, empenhados em reduzir a solidariedade ao Estado Mínimo que deixa todos os negócios na mão de quem já controla os mercados, a mentira do falso mercado da falsa concorrência, a mentira dos cartéis e da corrupção, dos impostos que são apenas para os trabalhadores e dos paraísos fiscais que são apenas para os ricos. E pensei que essa era a melhor prenda de Natal possível. A ideia de que é possível mudar tudo e que vamos começar já. Ainda esta semana.

Do blogue Versaletes de José Vítor Malheiros

AUDITORIA CIDADÃ À DÍVIDA PÚBLICA - Aprovação da Resolução

Petição - "Transparência nos benefícios fiscais"

Para:Exmº Sr. Presidente da República, Exmª Srª. Presidente da Assembleia da República, Exmº Sr. Primeiro-Ministro, Exmº Sr. Ministro das Finanças, Exmªs Senhoras e Senhores Deputados

Os subscritores da presente petição vêm por este meio solicitar a publicação integral da lista de contribuintes sujeitos passivos de IRC que, em 2010, usufruíram de benefícios fiscais. Esta publicação está prevista na lei do Orçamento de Estado e deveria ter tido lugar até 30 de Setembro de 2011, mas isso não aconteceu.

A transparência fiscal é um instrumento fundamental na Democracia. É um direito nosso enquanto contribuintes, eleitores e cidadãos. Mas a transparência fiscal neste domínio preciso é também um dever do Estado, previsto no art.º 120.º da Lei do Orçamento do Estado para 2011 (Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro, alterada pela Lei n.º 48/2011, de 26 de Agosto) que introduziu um aditamento ao Estatuto dos Benefícios Fiscais (art.º 15.º-A), obrigando à divulgação da sua utilização: “A DGCI deve, até ao fim do mês de Setembro de cada ano, divulgar os sujeitos passivos de IRC que utilizaram benefícios fiscais, individualizando o tipo e o montante do benefício utilizado”.

Esta norma inclui, entre outras, as empresas com benefícios contratuais ao investimento, as empresas instaladas na Zona Franca da Madeira, as empresas com benefícios à criação de emprego, as empresas com taxas reduzidas de IRC para a interioridade, as empresas com incentivos à investigação e desenvolvimento, as cooperativas com taxa reduzida de IRC, as instituições de ensino particular com taxa reduzida de IRC e as empresas com benefícios de ISV.

O Governo, que, em nome da austeridade, tem aumentado fortemente a carga fiscal sobre os cidadãos nos últimos meses e que tem garantido que será implacável no combate à fraude e evasão fiscais, não pode continuar a violar, por omissão, uma das regras de transparência previstas no próprio Orçamento do Estado.

Em Maio de 2011, o Ministério das Finanças publicou listas nominais de beneficiários de alguns regimes de benefícios fiscais, mas não de todos eles, admitindo tratar-se de uma “listagem que não é exaustiva”. Essa listagem referia os impostos sobre os quais incidiam os benefícios concedidos, mas não o tipo de benefício e o seu montante. O Ministério das Finanças anunciava um ”trabalho mais completo a realizar em Setembro, já depois de feita a liquidação dos Impostos sobre o Rendimento”. Essa listagem actualizada, exaustiva e com montantes não chegou porém a ser publicada, contrariando o disposto na lei.

Não sabemos, por exemplo, como deveríamos ter sabido até 30 de Setembro, o montante que empresas instaladas na Zona Franca da Madeira têm poupado com esta “fuga legal” aos impostos.

Não sabemos mas, de acordo com a Lei do Orçamento do Estado, deveríamos saber, já que são os impostos dos cidadãos individuais, de todos nós, que financiam estes benefícios.

Chegou a hora do Estado cumprir a Lei que foi sufragada pelos deputados na Assembleia da República.

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segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

José Dias Coelho - 50 anos


Faz hoje precisamente 50 anos que, aqui muito próximo do local em que nos encontramos, «a morte saiu à rua»: a PIDE assassinou, a tiro, o camarada José Dias Coelho: «O pintor morreu». Foi um crime brutal, um dos muitos praticados pelo fascismo ao longo do seu quase meio século de existência.

Portugal é possível! - "Mistérios de Lisboa"

O filme "Mistérios de Lisboa", adaptação do romance de Camilo Castelo Branco feita pelo chileno Raul Ruiz, que morreu em Agosto, continua a destacar-se entre a imprensa e a crítica estrangeira. Depois de na semana passada ter sido premiado com o galardão de melhor filme estrangeiro para a crítica canadiana, o filme repetiu a mesma proeza e foi distinguido na mesma categoria, na edição deste ano dos Golden Satellite Awards, atribuídos pela International Press Academy.

Património português

Felizmente ainda há quem trate do nosso património! Infelizmente não somos nós!

Tentativa de venda de comboio histórico da CP suscita escândalo e boicote na Europa

Morreu Kim Jong-Il

Morreu o líder da única dinastia comunista da História

Para "chorar" esta besta os norte coreanos formam parada:



Segue-se outro ditador e o PCP expressa condolências ao povo norte-coreano. Extraordinário!

domingo, 18 de dezembro de 2011

Vaclav Havel - (05/10/1936 - 18/12/2011)

AUDITORIA CIDADÃ À DÍVIDA PÚBLICA - Resolução da Convenção de Lisboa

Estas pessoas decidiram:

CONHECER PARA AGIR E MUDAR

Salários e pensões confiscadas, trabalho adicional não pago, mais impostos sobre o trabalho e bens básicos de consumo, mais taxas sobre a utilização de serviços públicos, menos proteção no desemprego, cedência a privados de bens comuns pagos por todos — tudo justificado pela necessidade de servir a dívida pública sem falha. Dizem-nos que cortar despesa pública, aumentar impostos e taxas, degradar o nível de provisão e de qualidade dos serviços públicos para servir a dívida sem falha, é “a única alternativa”. Mas como pode ser alternativa o que não chega sequer a ser uma solução? A austeridade, o nome dado a todos os cortes e confiscos, não resolve nenhum problema, nem sequer os da dívida e do défice público. Pelo contrário: conduz ao declínio económico, à regressão social, e depois disso à bancarrota. É chegado por isso o momento de conhecer o que afinal é esta dívida, de exigir e conferir a fatura detalhada. De onde vem a dívida e porque existe? A quem deve o Estado? Que parte da dívida é ilegítima e ilegal? Que alternativas existem para resolver o problema do endividamento do Estado? Tudo isso incumbe a uma auditoria à dívida pública. Uma auditoria que se quer cidadã para ser independente, participada, democrática e transparente.

1. DA CRISE FINANCEIRA À CRISE DA DÍVIDA

1.1 O mundo vive, desde 2007, os efeitos de uma crise internacional que começou por ser financeira, e rapidamente se transformou numa crise também económica e social. A actual crise, apenas comparável à Grande Depressão, teve origem na especulação financeira e imobiliária nos EUA. Foi o resultado de um processo de desregulamentação, liberalização e privatização dos mercados financeiros, que deu origem a uma economia insustentável, assente no endividamento. Esta trajectória anunciava-se, desde há muito, desastrosa.

1.2 Numa primeira fase da crise, os Estados salvaram o sistema financeiro global através de injecções massivas de liquidez, da socialização dos prejuízos da banca e da adopção de programas de estímulo económico. O preço, porém, foi uma degradação das contas públicas, provocada, quer pelos custos dos resgates bancários, quer pela queda das receitas fiscais, quer pelo aumento da despesa, resultantes da recessão. Os maiores défices orçamentais, embora estabilizadores da economia, contribuíram para um maior endividamento público em todos os países.

1.3 Na segunda fase, a crise estendeu-se à Europa, em particular à Grécia, à Irlanda e a Portugal, primeiro, e à Espanha e Itália, depois. Vítimas de uma arquitectura monetária europeia deficiente, estas economias viveram na última década uma degradação da sua posição na economia europeia e mundial, que resultou em estagnação económica ou, quando muito, num crescimento assente em bases frágeis, só possível através do recurso ao endividamento, público e privado. A vulnerabilidade económica estrutural destes países, somada à crise financeira internacional, foi explorada pelos mercados financeiros através de uma euforia especulativa em torno da dívida pública de que se não conhecem precedentes.

1.4 A resposta a este ataque foi, incompreensivelmente, a imposição de programas de austeridade brutais a estes países, agravados pelas condições exigidas nos vários resgates financeiros da troika BCE/FMI/FEEF. A austeridade condena os países intervencionados ao aumento do desemprego, à destruição progressiva do Estado social e à recessão sem fim; conjugada com a que está a ser praticada em todos os outros da UE, produz uma depressão à escala europeia e mundial que as previsões oficiais já não ignoram.

2. ENDIVIDAMENTO E CRISE DA DÍVIDA EM PORTUGAL

2.1 Entre 2000 e 2005, verificou-se um aumento do peso da dívida pública no produto interno bruto (PIB). Até 2005, este rácio esteve sempre abaixo de 60%, o máximo permitido pelos critérios de Maastricht, estando o seu crescimento relativamente contido até 2008. O endividamento público disparou apenas na sequência da crise financeira aquando do resgate do sistema financeiro e da recessão. No entanto, o mesmo não se passou com a dívida do sector privado, cujo crescimento e internacionalização têm sido fomentados pela vaga de financeirização observada ao longo da última década.

2.2 À semelhança da Grécia, Itália e Espanha, o problema de base da situação que se vive em Portugal resulta das condições de adesão ao euro e da sua arquitectura. Não só a taxa de câmbio de entrada no euro se encontrava excessivamente apreciada, dado o receio de pressões inflacionistas, como também a própria arquitectura subjacente ao euro é bastante deficiente e protectora dos interesses dos sectores exportadores dos países do centro e do sistema financeiro privado, em detrimento dos interesses da generalidade das cidadãs e cidadãos europeus.

2.3 A resposta à crise da dívida tem consistido em sucessivos programas de austeridade. Torna-se cada vez mais claro que este tipo de resposta condena a sociedade portuguesa ao aumento do desemprego, ao desmantelamento do sector público produtivo e à destruição progressiva do Estado social, sem contudo reconduzir a dívida pública a níveis económica e socialmente sustentáveis, nem criar perspectivas de recuperação económica.

2.4 No início da intervenção da troika, a dívida pública portuguesa tinha ultrapassado os 97% do PIB. Em 2013, quando é suposto esta intervenção terminar, deverá situar-se acima de 106% do PIB desse ano. Entretanto, o nível do PIB terá regredido para valores de há quase uma década, e o desemprego situar-se-á acima dos 13%. Estas são previsões do próprio governo português. A OCDE estima uma taxa de desemprego de 14,2%. No final da intervenção da troika, Portugal terá uma dívida pública maior e estará mais pobre. Reconhecer-se-á então que a dívida pública é insustentável e que os sacrifícios foram inúteis, tendo servido apenas para agravar os problemas.

2.5 A austeridade não oferece soluções. É necessário procurar respostas por outras vias. Para isso, a questão da dívida deve ser encarada de um ponto de vista realista e compatível com a salvaguarda de valores e direitos humanos fundamentais universalmente reconhecidos, diverso do adoptado pelo governo português. Torna-se urgente a reestruturação da dívida pública liderada pelo Estado soberano, estendendo a maturidade dos empréstimos, reduzindo as suas taxas de juro, ou mesmo reduzindo o capital em dívida. Requer-se a realização de uma auditoria cidadã à dívida pública.

3. A NECESSIDADE DE UMA AUDITORIA CIDADÃ À DÍVIDA PÚBLICA PORTUGUESA

3.1 As cidadãs e cidadãos continuam a desconhecer a origem, a composição e os valores rigorosos da dívida pública portuguesa. A propaganda de matriz neoliberal promove a ideia de que a dívida pública se ficou a dever sobretudo aos gastos com as funções sociais do Estado. No entanto, há contratos públicos pouco escrutinados, de que resulta, a prazo, maior endividamento público. É o caso de diversas Parcerias Público-Privadas (PPP), que, como indiciam relatórios do próprio Tribunal de Contas, se têm vindo a revelar gravosas para o Estado português.

3.2 Na ausência de qualquer vontade por parte das autoridades de encarar o problema da dívida na óptica dos interesses da população portuguesa no seu conjunto, tomamos a iniciativa de iniciar um processo de auditoria cidadã à dívida pública. A auditoria deve avaliar a complexidade do problema da dívida, calcular a sua dimensão, determinar as partes da dívida que são ilegais, ilegítimas, ou insustentáveis, e exigir a sua reestruturação e redução para níveis social e economicamente sustentáveis. Esta auditoria pode levar à conclusão de que há parcelas da dívida que devem ser repudiadas.

3.3 A realização de uma auditoria cidadã que permita determinar a dimensão e complexidade do problema da dívida pública é um direito legítimo das portuguesas e dos portugueses. Está mais do que comprovado que a via da austeridade, subserviente aos mercados financeiros, não oferece soluções para nenhum problema, incluindo o do endividamento.

3.4 A austeridade, ou a estratégia de “desvalorização interna”, como é conhecida entre economistas, promete resolver de um só golpe os problemas do défice das contas públicas e das transacções com o exterior. Através de redução da provisão de serviços públicos e de aumentos de impostos e de taxas, pretende reduzir o défice público. Não ignora o efeito recessivo destas medidas, antes o considera instrumental para a redução do défice externo, já que considera que o desemprego induzido pela recessão, combinado com a retracção da protecção social aos desempregados, são os mecanismos que podem forçar a desejada redução dos salários. A redução dos salários é desejada porque é considerada como um meio para a recuperação da “competitividade” e o reequilíbrio das transacções correntes.

3.5 Esta estratégia, desenhada a régua e esquadro pelo FMI, é incapaz de produzir os resultados que promete. Quanto ao défice das contas públicas e das transacções com o exterior, ignora o risco de uma permanente derrapagem decorrente da retracção da receita fiscal criada pela recessão. Quanto ao défice externo, não tem em conta o efeito social de um desemprego massivo, nem a anulação da desvalorização pela adopção de uma estratégia semelhante na maioria dos países da UE. A estratégia da austeridade é socialmente brutal e economicamente fútil.

3.6 No entanto, além das razões económicas, há razões jurídicas e morais fundamentais que justificam esta auditoria. São legítimas as taxas de juro usurárias que decorrem de enfermidades sistémicas e de “contágios” no interior de uma zona euro mal concebida? São legítimas condições impostas por credores que protegem os interesses de alguns segmentos privados restritos, e têm custos tremendos sobre as camadas mais desprotegidas da sociedade e sobre toda a gente que que vive do seu trabalho?

3.7 Há que ter presente, acima de tudo, que a dívida pública é apenas um dos múltiplos compromissos do Estado português. Além das suas obrigações contratuais juntos dos credores, o Estado tem deveres inalienáveis para com todas as cidadãs e cidadãos, quer das gerações presentes, quer das gerações futuras. O Estado português tem de ser o garante de direitos sociais fundamentais consagrados na Constituição e no direito internacional. Fazer prevalecer os direitos dos credores sobre todos os outros é ilegítimo não só do ponto de vista moral como do ponto de vista jurídico.

4. PRINCÍPIOS FUNDADORES DA INICIATIVA PARA UMA AUDITORIA CIDADÃ À DÍVIDA PÚBLICA

As actividades da Iniciativa para uma Auditoria Cidadã à Dívida Pública portuguesa (IAC) são regidas pelos seguintes princípios fundadores:

a) Democraticidade – A IAC procura dotar as cidadãs e os cidadãos de novos instrumentos de monitorização, fiscalização e intervenção na vida pública que reforcem a democracia. A IAC é composta e legitimada por representantes dos vários segmentos da sociedade, por se entender só assim ser possível a intensificação do debate público sobre a dívida e a emergência de soluções que permitam afastar o cenário de declínio sem fim à vista;

b) Natureza participativa – A IAC coloca as cidadãs e cidadãos no centro de um processo com influência directa na vida política portuguesa, tornando a intervenção e participação cidadã numa componente fundamental dessa vida política. Procura-se, assim, mobilizar a participação cívica para a exigência de uma deslocação na abordagem ao problema da dívida, reorientando--a para a necessidade de uma reestruturação liderada pelo Estado português que torne o serviço da dívida compatível com os direitos fundamentais da população portuguesa e a sustentabilidade financeira do Estado português;

c) Transparência – A IAC rege-se pelos princípios fundamentais da transparência e prestação de contas. A estrutura e funcionamento da IAC serão alvo de escrutínio contínuo e a iniciativa compromete-se a prestar contas públicas de todas as suas operações e decisões.

d) Controlo pelos cidadãos – A IAC é uma plataforma que tem por base um modelo de participação cidadã na tomada colectiva de decisões políticas e económicas. A IAC procura garantir que a exigência, feita à população, de suportar a maior parte dos custos da crise seja acompanhada por uma capacidade activa na sua gestão.

e) Independência – A gestão do processo de financiamento da dívida pública tem sido centralizada nas mãos de tecnocratas, gestores de dívida pública e do sector financeiro nacional e internacional, sem legitimidade democrática. Uma auditoria que procure alternativas para a resolução do problema da dívida requer um processo participativo dinamizado por uma comissão independente dos interesses financeiros e políticos instalados, plural na sua composição e tecnicamente capacitada.

5. OBJECTIVOS DA AUDITORIA CIDADÃ À DÍVIDA PÚBLICA PORTUGUESA E DIFICULDADES A ULTRAPASSAR

5.1 O actual contexto nacional e internacional torna evidente a urgência de um processo de auditoria controlado pelas cidadãs e cidadãos que garanta em simultâneo o rigor, a exaustão, e a transparência. A Auditoria Cidadã à Divida Pública portuguesa deverá ser:

a) Uma auditoria integral, que terá um perímetro alargado. Por dívida pública entendem-se todos os compromissos assumidos directa e indirectamente pelo sector público administrativo, nomeadamente a dívida comercial, a dívida de privados garantida e/ou assumida pelo sector público, o endividamento das empresas públicas, as condições financeiras resultantes dos contratos das Parcerias Público-Privadas, o endividamento contraído pela tutela e pelas regiões autónomas. Compete à auditoria avaliar o processo de endividamento, o enquadramento institucional desse processo e os parâmetros de transparência inerentes a todos os procedimentos. Finalmente, procurar-se-á clarificar as relações circulares entre os detentores da dívida pública, em particular a banca, o Estado e o BCE, avaliando as suas implicações sobre o leque de escolhas políticas. No âmbito de uma auditoria integral, avaliar-se-á a legalidade, a legitimidade e a sustentabilidade económica, social e ambiental da assunção desses encargos.

b) Uma auditoria instrumental, que, não constituindo um objectivo em si mesma, terá como objectivo declarar, caso as conclusões do processo o suportem, a ilegalidade, a ilegitimidade, ou a insustentabilidade de parcelas da dívida pública, entendida no seu universo mais alargado, contribuindo assim para reforçar a exigência de uma reestruturação da dívida pública que proteja os interesses das cidadãs e cidadãos da República.

c) Uma auditoria pedagógica, que, para além da sua componente política, vise contribuir efectivamente para uma melhor compreensão do problema da dívida pública, procurando oferecer uma descrição detalhada e acessível da sua composição e das principais relações de força que medeiam este processo.

d) Uma auditoria participativa, que envolva uma componente técnica e o apoio e participação de especialistas, mas cujo processo seja controlado pelas cidadãs e cidadãos. Todo o processo deverá ser definido e implementado no sentido de ter a agilidade necessária para prestar contas a qualquer pedido de informação ou reivindicação efectuado por uma cidadã ou cidadão. A legitimidade do processo emana da comunidade cidadã e é, portanto, qualitativamente diferente das auditorias efectuadas por firmas de contabilidade e auditoria com conflitos de interesses, e cujos critérios de transparência e responsabilização são insuficientes para lhes ser atribuída credibilidade. O processo de auditoria cidadã deverá criar formas eficazes de disseminação regular e frequente dos resultados da investigação.

5.2 Em nome da transparência democrática, devemos enumerar alguns dos desafios que se apresentarão e os obstáculos que condicionarão, à partida, este processo:

a) As exigências técnicas inerentes à condução de uma auditoria;

b) Os obstáculos burocráticos à requisição e obtenção de documentação administrativa;

c) A definição adequada do perímetro do Estado;

d) A substituição acelerada de credores comerciais por instâncias internacionais;

e) A resistência política e administrativa à intervenção e participação cidadã;

f) A qualificação da auditoria como processo perverso, fútil e ameaçador da estabilidade;

g) A fraca mobilização da sociedade portuguesa para um processo delicado, exaustivo e moroso.

6. COMPOSIÇÃO ORGÂNICA DA IAC E SUAS INCUMBÊNCIAS

6.1 A IAC tem como órgão principal a Comissão de Auditoria (CA), entidade que articula uma participação cidadã activa com o contributo especializado de peritos, e que se rege pelos princípios fundadores da IAC. Este órgão pode apoiar-se em grupos de trabalho, nomeadamente um Grupo Técnico (GT) e criar uma Coordenação Executiva (CE) . Em termos gerais, incumbe à CA:

a) Definir o perímetro da dívida pública a auditar mediante uma avaliação da informação disponível e suas formas de acesso;

b) Definir o horizonte temporal da auditoria a realizar;

c) Avaliar o processo de endividamento e a situação actual da dívida pública nas suas diversas componentes;

d) Avaliar a sustentabilidade social da dívida pública, considerando, nomeadamente, o trade-off entre os juros pagos com o serviço da dívida e a despesa com outras componentes sociais e ambientais do orçamento, nomeadamente a provisão pública de bens fundamentais;

e) Assegurar a informação pública ao longo de todo o processo de auditoria;

6.2 No quadro dos seus objectivos, a IAC apoiará a iniciativa local e sectorial dos cidadãos e cidadãs, orientada para o escrutínio e transparência das contas públicas.

7. COOPERAÇÃO INTERNACIONAL

7.1 A IAC enquadra-se dentro de um movimento internacional que tem por base a Declaração de Atenas e a Aliança Europeia de Iniciativas para Auditoria Cidadã. Nesse âmbito, irá:

a) Procurar apoio técnico junto das organizações que, à escala internacional, têm vindo a acumular conhecimento no domínio das auditorias à dívida pública e sua reestruturação;

b) Retirar todos os ensinamentos das experiências de auditoria cidadã realizadas noutros países;

c) Articular-se com processos semelhantes que decorrem noutros países no quadro da Aliança Europeia de Iniciativas para uma Auditoria Cidadã e com os movimentos subscritores da Declaração de Atenas;

d) Subscrever a Declaração de Atenas.

Lisboa, 17 de Dezembro de 2011

IAC

Cesária (27/08/1941 - 17/12/2011)







Cesária Évora

quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

"O vídeo que a Prefeitura do Rio de Janeiro não quer que você veja... "

"Na Islândia já se faz combustível a partir de CO2"

"Saúde - em estado de insuficiência económica"

Quando no projecto neoliberal se fala em cortar as “gorduras do Estado” não tenhamos dúvidas que se está a falar de saúde e educação, embora para o público em geral seja compreendido como referido à Administração Central. É um dos equívocos. A grande fundadora Margaret Tatcher esteve quase a desmantelar grandes hospitais do serviço público inglês como o Hammersmith, se não tivesse havido um movimento internacional de salvaguarda.

Saiu agora o decreto-lei sobre as taxas moderadoras. Já saiu a 29 de Novembro e entra em vigor a 1 de Janeiro de 2012. Toda a discussão pública está a ser posterior. São aí definidos como tendo insuficiência económica os utentes cujo rendimento médio familiar “seja igual ou inferior a uma vez e meia o valor do indexante de apoios sociais” Ou seja, só é “insuficiente” aquele que pertencer a um agregado familiar cujo rendimento mensal seja inferior a 628 euros e 83 cêntimos, de acordo com o cálculo que está a ser feito pelos Serviços Sociais da Saúde. Tal definição vale para as taxas moderadoras e para o pagamento de transportes não urgentes. Por exemplo, um casal em que qualquer dos dois ganhe o ordenado mínimo, 485€, e cuja existência é feita de milagres – renda, água, luz, transportes – tem que pagar taxa moderadora se ousar ir a um serviço público de saúde e deverá arranjar dinheiro para pagar o transporte. Com as alterações já em vigor temos observado falta de doentes às consultas hospitalares, que atribuímos a falta de dinheiro para os transportes. Talvez a partir de 1 de Janeiro se aliviem então as listas de espera...

E a partir dessa data assistiremos também a que os que são “suficientes” (acima dos 628€ para toda a família) paguem 20 € por uma ida à urgência e 5 euros por uma consulta. E aqueles que dizem que o pagamento das taxas está a moderar a ida à urgência e a desviar para os Centros de Saúde, está a falar da “Alice no país das maravilhas.” Os cuidados primários não têm capacidade para receber. Essa capacidade tem diminuído e não se vê projecto concreto de unidades locais de saúde. Há apenas afirmações genéricas, discursos de invenção da roda, que qualquer pessoa assina por baixo. Mas que tem um efeito demagógico para quem estiver fora o assunto.

A crueza dos números ao nível do utente é esta. Parece que estamos apenas a ver um detalhe, um pormenor. É preciso é ver “o todo”. Mas é isto que vai atingir milhões de pessoas. São os números pequeninos... Depois há os números muito grandes, os dos hospitais e esses também serão eles próprios insuficientes.

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P.S. Posteriormente à saída deste decreto-lei e ao anúncio das subidas de tabelas das taxas moderadoras para 20€ na urgência hospitalar e 5€ na consulta no centro de saúde, saíram tabelas que indicam o pagamento de exames auxiliares de diagnóstico na urgência (que são pedidos quase sempre) podendo o custo total chegar a 50€. A consulta de especialidade hospitalar terá o custo de 10€, a ida à urgência no centro de saúde custará 10€, a ida à urgência no centro de saúde vai custar 10€.

Tendo o Ministro de Saúde dito no programa Prós e Contras que 5 milhões de portugueses não pagarão taxas moderadoras, isto inclui as crianças até aos 12 anos que estão excluídas das taxas, os doentes oncológicos em sessões de quimioterapia e outras situações mais específicas. Os restantes serão pertencentes a agregados familiares com menos de 628€ mensais, o que nos indica que estes abrangem alguns milhões de pessoas, dando-nos a dimensão da pobreza em Portugal. Mas entre os que irão pagar porque estão acima do escalão, situam-se muitos que vivem na fronteira da pobreza e para os quais estes pagamentos se transformam num verdadeiro bloqueio de utilização do Serviço Nacional de Saúde, que deveria ser gratuito e que funciona na base do Orçamento Geral do Estado e portanto dos impostos.

Um texto de Isabel do Carmo publicado em Entre as brumas da memória