terça-feira, 24 de janeiro de 2012

"Música"


Loira Lisboa, amolecida e calma,
com vitrines de sol pelos passeios
e as avenidas com passeios de almas.
As tardes castas. E nas sombras mansas
nem há crianças
a brincar na rua.
Céu rosado, menino, Céu de bruços,
a escutar os soluços
da Terra morna e nua.
Nas matas presas pelas sombras finas
ninguém achou as sinas
traçadas no chão brusco...
Nem os olhos das casas, aos domingos,
espreitando ao lusco fusco...
Erguida a noite sobre o chão brilhante
- as estações morreram com a nortada -
não há pomba, nem luz, nem viajante,
que pare na pousada.
Nas praças largas a abraçar fantasmas
ficaram os pedintes de amargor.
Pés brancos, enterrados pela água,
e as mãos pendentes, pelo Céu sem cor.
Entre a música eterna da saudade
os rios vão de corações abertos.
Ao longe,
búzios a chorar jardins.
Ao perto,
estátuas a sonhar desertos.

Natércia Freire

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